quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

A festa da firma


Na minha época de redação, dezembro chegava sempre agitado. Era o tempo de decidir a escala especial de folga do fim do ano – quem trabalha no Natal e quem trabalha no Ano Novo. Sobravam divergências e eventual ofensa à mãe alheia. Mas dezembro também era um tempo alegre, era tempo da festa da firma.

Após passar o ano inteiro explorando os pobres funcionários, principalmente os jornalistas, o dono do jornal decide promover uma festança. Para alguns, é um lampejo de humanidade do patrão, mas, para mim, é pura estratégia. Ele sabe que o jornalista é facilmente seduzido por uma boca-livre. Alimente um jornalista e ele se tornará seu amigo, dizia um filósofo de botequim. Ele esquecerá até que nunca lhe pagaram as horas extras trabalhadas.

A festa da firma é, portanto, um clássico exemplo da política “pão e circo”. Mas quem se importa com isso? Adoramos comida e bebida fartas, show com banda ao vivo e até sorteio de prêmios. Na minha época, começavam com brindes institucionais e acabavam com o prêmio máximo da noite, a cobiçada semana com a família numa colônia de férias em Mongaguá. Eu, que nessas ocasiões sempre preferi o pão ao circo, cheguei a criar um grupo de amigos batizado de “a nuvem dos gafanhotos”, que perambulava pelas mesas de comida deixando só devastação.

O evento de confraternização é uma excelente ocasião para os jornalistas interagirem com pessoas de outros departamentos, coisa rara, como a turma do administrativo e a turma do comercial, esta também chamada de “os vendedores de anúncio”. Quase todo jornalista vai à festa, até mesmo aqueles que nunca conseguem um alvará da patroa para as bebedeiras habituais pós-fechamento. Só não aparece a ala dos intelectuais, jornalistas que acreditam que a festa da firma não passa de uma forma primitiva de entretenimento, regada a axé music, cerveja e suor. Sociologicamente falando, é claro.

Na festa da firma, muita gente perde o pudor, se revela, paga mico ou arruma confusão, mesmo porque as taxas de sangue no álcool ficam baixíssimas. A vantagem de ficar um pouco sóbrio é poder testemunhar todas as aberrações da noite e ter matéria-prima para fofocar com os colegas no dia seguinte. Jamais esquecerei a festa em que o foca do caderno de Variedades, aquele moço tímido e de poucas palavras, foi subitamente arrebatado pela música do Abba, subiu na mesa, arrancou a camisa, rebolou como uma lagartixa e gritou: “I am the queen, I am the dancing queen!”. Depois disso, nunca mais foi visto na redação.

5 comentários:

Fernando Império disse...

Muito bom!!! Além das festas da firma tem as coletivas de imprensas das empresas para mostrar o balanço do ano em que oferecem almoço e prêmios banais... Jornalista adora fazer cara de blasé, mas no fundo, no fundo, adora uma boquinha livre..

Pabline Felix disse...

Ótimo post como sempre, Duda!
Eu vou para a minha primeira festa da firma no próximo sábado e, claro, estou morrendo de medo!
Além das oportunidades de mico bebendo e comendo, teremos o imperdível AMIGO OCULTO. Se entre familiares é certeza que dá merda, mal posso esperar pra ver em uma empresa.

Abração!

Gardênia disse...

Duda, como sempre você diz tudo e põe o dedo na ferida. Nós jornalistas somos mesmo mortos de fome! Somos iludidos por qualquer miçanga ou espelhinho. Eu mesma estou saindo agorinha pra uma festa, mas não pensem que estão me comprando não...

Helena Pawlow disse...

Ótimo post!!!!
Pura e cruel realidade

Duda Rangel disse...

Amigos,
Espero que todos tenham aproveitado bastante as vossas festas da firma! Lamento apenas ter esquecido de pedir a vocês uma quentinha com algum resto de comida das festas. Sacumé, a sítuação não tá facil...
Beijos e abraços do Duda.