segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Até 2010, meus amigos!


O post de hoje tem uma despedida e a expectativa de um breve reencontro. Resolvi me dar "férias" por uns dias. Volto ao blog no dia 4 de janeiro. Após muito tempo, eu fiz a minha própria escala de folga de fim de ano, e isso é muito bom. Melhor ainda é saber que não tenho planos para os próximos dias, inclusive planos de fazer planos para 2010.

Decidi que os dias que restam deste ano serão diferentes dos dias que restavam em anos passados. Por que tudo tem de ser sempre tão igual nesta época? O Especial do Roberto Carlos, o Especial da Xuxa, a Missa do Galo, as insuportáveis compras de presente no shopping lotado, as reuniões familiares de confraternização e briga, o chester esquartejado, o champanhe barato, a porra da caixinha do carteiro, do porteiro, do lixeiro e de outros "eiros", a São Silvestre com vitória de algum queniano, o arrependimento por tudo que não foi feito, as novas resoluções e ilusões.

Minhas “férias” do blog são uma incógnita. Só sei que serão diferentes. Posso me entregar aos prazeres carnais da colônia de férias de Mongaguá, que até hoje ainda não conheci, como posso partir para um retiro espiritual num templo budista. Posso perambular pela São Paulo vazia ou apenas ficar de bobeira em casa, ao lado do Nestor, sem perceber o tempo passar.

A única coisa certa é que preciso agradecer o carinho que recebi de muita gente ao longo deste ano! Adorei escrever neste blog e, por meio dele, conhecer pessoas de todos os cantos do Brasil e de fora dele, de todas as idades, jornalistas ou não. Fui até caso de estudo de TCC de um pessoal bacana da Bahia. E o melhor: eram estudantes de jornalismo e não de psiquiatria!

A todos um fim de ano diferente e um 2010 com muitos desafios. Ou a vida fica sem graça! Beijos e abraços do Duda!

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Dicas de presentes de Natal


Conheça os mimos mais indicados para cada tipo de jornalista:

Para um jornalista ecochato que trabalha com sustentabilidade: um belo pinheiro de origami feito com diplomas do curso de jornalismo.

Para um jornalista que cobre a guerra urbana no Rio de Janeiro: um plano de assistência funerária da empresa Vá com Deus, categoria SuperMegaPlus.

Para um jornalista que separa o sujeito do predicado com vírgula: o livro “Gramática Básica da Língua Portuguesa” (versão com ilustrações).

Para um jornalista cultural descolado: uma camiseta bordada da Cavalera ba-ca-nér-ri-ma ou óculos estilo Lady Gaga para ferver no réveillon.

Para um jornalista nerd da área de tecnologia: uma boneca do site Real Doll para ele vivenciar uma prática sexual mais próxima da realidade.

Para um jornalista militante de esquerda: um pôster da Dilma Rousseff de corpo inteiro em sua fase guerrilheira.

Para um jornalista militante de direita: uma coleção de luxo (capa dura) com as melhores reportagens da Veja de todos os tempos.

Para um assessor de imprensa que sempre liga para a redação no horário de fechamento: um relógio Rolex falsificado de uma banca de camelô.

Para um jornalista recém-formado que não consegue arranjar emprego: o livro de auto-ajuda “Os vencedores são aqueles que nunca desistem”.

Para um jornalista sem emprego: uma cesta básica e um vale-frila.

Para um jornalista com 30 anos de carreira: a obra completa “Em busca do tempo perdido”, de Marcel Proust.

Para um jornalista que adora um CTRL C / CTRL V: o livro “Mil piadas pra Twitter”, com frases engraçadas já prontas de até 140 caracteres.

Para um fotógrafo doidão: um convite para uma balada num inferninho suspeitíssimo do centro de São Paulo com direito a todo tipo de loucura, em plena noite de Natal.

Para todo tipo de jornalista: um saco para treinamento de boxe com a cara do Gilmar Mendes para o jornalista encher de porrada e aliviar a tensão do dia-a-dia.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Eu, ranzinza


Tomando uma cerveja com um amigo, conversávamos sobre o meu blog. Quanto mais álcool entra em nosso sangue, mais sinceridade escapa de nossa boca. “Duda, você sempre foi um cara otimista, mas, lendo alguns de seus posts, notei que você está muito ranzinza, com a nossa profissão, com a vida. Cara, você ficou mais chato que taxista”, disse-me ele. Como ele estava pagando a cerveja, ouvi a crítica e não reclamei. No fundo, estava certo. Estou ficando um velho ranzinza. Mas será que um pouco de insatisfação é tão ruim assim?

A conversa de bar fez lembrar-me de um ensaio do escritor peruano Mario Vargas Llosa, publicado na edição de outubro da revista Piauí, uma defesa do romance, da literatura. Entre outras coisas, Llosa fala do poder que a insatisfação humana, muitas vezes despertada pelos livros, tem de transformar o mundo. Talvez eu nem faça literatura – muitos dizem que blog não é literatura –, mas, ainda assim, acredito que posso, com as minhas palavras, desenvolver nos leitores “uma sensibilidade inconformista em relação à vida”, como escreve Llosa.

A seguir, destaco um trecho do ensaio que achei interessante:

“Viver insatisfeito, em luta contra a existência, significa empenhar-se, como dom Quixote, bater-se contra os moinhos de vento, condenar-se, de certa forma, a viver as batalhas travadas pelo coronel Aureliano Buendía, em Cem Anos de Solidão, sabendo que as perderia todas. Isso é provavelmente verdadeiro; mas também é verdadeiro que, sem a revolta contra a mediocridade e a sordidez da vida, nós, seres humanos, ainda viveríamos em condições primitivas, a história teria acabado, não teria nascido o indivíduo, a ciência e a tecnologia não se teriam desenvolvido, os direitos humanos não teriam sido reconhecidos, a liberdade não existiria, porque tudo isso nasceu de atos de insubmissão contra uma vida percebida como insuficiente e intolerável.”

Estou decidido: em 2010, continuarei um cara ranzinza, insuportavelmente ranzinza.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Carta de um jovem jornalista ao Papai Noel


"Olá, Papai Noel. Eu me chamo João e acabei de me formar em jornalismo, como milhares de outros jovens do meu Brasil. Este ano, eu fiquei meio chateado com essa história de o diploma não ser mais obrigatório, mas não vou desistir da profissão que eu amo! Com ou sem diploma, porém, o problema maior é que está muito difícil arrumar um emprego. Estou justamente escrevendo para pedir uma oportunidade de trabalho neste Natal. Deixei uma meia pendurada na janela com meu currículo atualizado.

Nem precisa ser um emprego muito bom. Para começar, vale qualquer coisa. Sei que vou ganhar um salário bem pequeno, mas já estou mais conformado com isso. Na verdade, eu estou louco para aprender jornalismo na prática. Estão dizendo que em 2010 a crise vai passar, que a vida vai melhorar e estou mais confiante. Meus amigos dizem que sou muito otimista, que acredito em tudo, até em Papai Noel. Mas a gente precisa ser assim.

Eu sei que cometi alguns erros em 2009, mas nada tão grave que não me faça merecer este emprego. O senhor vai compreender. Eu matei umas aulas na faculdade, fiquei de bobeira na internet, escrevendo bobagem no Twitter, fuçando o Orkut alheio, lendo o blog do Duda Rangel. Também gastei dinheiro com a Playboy da Fernanda Young e eu sei que isso não foi legal. O único vício que eu tenho mesmo é beber demais, embora falam que todo jornalista bebe. Também dou um tapa num baseado de vez em quando, mas só quando estou estressado e com dor de cabeça. E, se é para uso medicinal, não há problema, o senhor bem sabe.

No geral, eu até fui um aluno dedicado na faculdade. Fiz os trabalhos direitinho, li um monte de livros que eles indicaram. Eu também sou bem-informado. Não gosto de ler jornal, mas sigo todas as notícias na internet, até de política internacional. E o meu Português é bem correto também. O senhor pode notar que não tem nenhuma vírgula separando o sujeito do predicado nesta carta, não tem “menas” nem exceção com “ss”.

Em 2010, como jornalista real, estou louco para ver se todas aquelas coisas que o Duda Rangel escreve no blog dele são verdadeiras mesmo. Estou com um puta tesão (ops, desculpa!) de ir para a rua, fazer reportagens, buscar sempre a história mais bacana, denunciar as coisas que estão erradas, comer coxinha de frango na padoca, ganhar um monte de jabá e almoçar de graça nos eventos. Eu também quero conhecer o tal pescoção, trabalhar até altas horas da madrugada. Só não quero ser corno, mas este pedido fica para o outro Natal, está bom? Não vou abusar mais do senhor! Obrigado, Papai Noel. João."

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Imprensa Retrô 2009


O diploma caiu. A violência contra os jornalistas subiu. A Globo brigou com a Record. A Record brigou com a Globo. Duas jornalistas quase saíram no tapa por uma entrevista. A Gazeta Mercantil morreu. A Silvia Poppovic ressuscitou. O “jornalismo” do Ratinho voltou. O Milton Neves ficou de mal do Roberto Justus. Anunciaram de novo a “morte” do jornal impresso. O Twitter virou fonte de informação. O Gay Talese, na Flip, convocou os jornalistas a levantarem a bunda da cadeira e irem para a rua. O Sarney calou o Estadão. A Folha criou a “ditabranda”. O Brasil ficou atrás do Haiti no ranking da liberdade de imprensa. O Planalto lançou seu blog (sem espaço para comentários). Jornais declararam guerra ao blog da Petrobras. O Jornal Nacional completou 40 anos, com o pior índice de audiência de sua história. Uma jornalista foi finalista do Big Brother Brasil. Nenhuma jornalista engravidou de senador. O Zé Bob resgatou a magia do jornalismo investigativo. A prótese (dentária) do Wagner Montes voou no Balanço Geral. O Tomás Turbano ganhou os telejornais. Paula Tejano também. As pupilas do Caco Barcellos, como sempre, bateram um bolão. O Galvão Bueno falou muita abobrinha no acidente do Massa. O Luciano do Valle chamou a Band de Globo. O Vampeta virou comentarista esportivo. O Britto Jr. decidiu ser Pedro Bial. O Alborghetti foi para o inferno. A desgraça do Duda Rangel ficou conhecida em todo o Brasil. O Fantástico quis virar TV Fama. O Globo Esporte de São Paulo quis virar Pânico na TV. Lula criticou a imprensa. Fomos culpados pelas mazelas do Congresso. E nenhum jornalista, infelizmente, deu uma sapatada no Gilmar Mendes!

Mas 2010 está aí, minha gente!

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Clô e os sonhos para 2010


Cercado por jornalistas em Brasília, o então deputado federal Clodovil Hernandes procura justificar sua declaração de dias antes de que a também deputada Cida Diogo jamais poderia trabalhar como prostituta por sua ausência de beleza. “Eu tenho culpa que ela nasceu feia, gente?”

Por estas e outras, Clô, mesmo já tendo passado desta para uma pior, foi o grande vencedor de nossa última enquete – Qual o entrevistado perfeito para uma matéria bem polêmica? – com 36% dos votos, superando fortes rivais como Caetano Veloso e FHC, que acabaram empatados com apenas 12% cada um.

Imaginei como seria uma entrevista psicografada com o Clodovil. Logo na primeira pergunta – Como está sua vida após a morte? –, já rolaria uma declaração polêmica: “Meu amor, estou odiando isso aqui. Muita gente sem educação, exagerada, gente que não sabe arder no fogo sem gritar. E como tem gente picareta também, está pior que o Congresso Nacional. Também não gostei do anfitrião, um sujeito de péssimo gosto. Ninguém mais usa aquele tridente cafona, nem em baile de carnaval de subúrbio. E o calor? Aqui, eles não sabem o que é ar-condicionado! Ai, meu amor, que saudade do vento fresco de Ubatuba...”

A próxima enquete já está em ritmo de Ano Novo. Como dizem que sonhar não custa nada, sonhemos. O que você, como jornalista, espera de 2010? Bons sonhos!

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O plantador de notícias


Assessor de imprensa liga para a redação de um site de fofocas.

- Redação, Ricardo, boa tarde.
- Oi, Ricardo. Aqui é o Guto Oliveira, assessor de imprensa das estrelas. Tudo bem?
- Tudo bom.
- Eu tenho uma notícia quentíssima da cantora Jessyca Motta.
- De quem?
- Como de quem? Não conhece a Jessyca Motta? A mulher que já bombou cantando música eletrônica, gospel...
- Ah, claro, desculpe. É que eu sou jornalista novo por aqui...
- Ricardo, é o seguinte: a Jessyca tá gravidíssima. Ela queria divulgar a notícia aos fãs pelo Twitter, mas eu não deixei. Quis dar o furo para vocês, que são o melhor site de celebridades do Brasil.
- Opa, Guto, que bacana. Vamos divulgar, sim!
- Vou mandar um release com mais detalhes. A Jessyca tá amando essa história de ser mãe. O pai, então, tá todo babão. Ela está tão feliz que vai até lançar um novo disco em breve, mas com uma pegada mais infantil, sabe? É novo público dela.
- Que ótimo! Manda o release, sim!

Guto desliga o telefone. A seu lado está a cantora Jessyca Motta.

- Guto, eu não acredito que você fez isso! Eu não estou grávida!
- Querida, você não queria voltar à mídia? Se prepara porque vai chover jornalista querendo saber mais sobre a sua gravidez, o sexo da criança, o nome...
- Mas eu tirei meu útero há dois anos! E se alguém descobre? E se falam com o médico?
- Com o médico eu já me entendi. Ele vai ficar quieto. E mais: esses jornalistas não investigam nada. Só querem saber de notícia fácil. Compram qualquer coisa.
- Ai, meu Deus, Guto, só você mesmo!
- E não esqueça, querida: daqui a dois meses, você vai perder esta criança! Então, aproveite para ser feliz agora, porque, depois, o babado vai ser você sofrer muito na mídia.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

A festa da firma


Na minha época de redação, dezembro chegava sempre agitado. Era o tempo de decidir a escala especial de folga do fim do ano – quem trabalha no Natal e quem trabalha no Ano Novo. Sobravam divergências e eventual ofensa à mãe alheia. Mas dezembro também era um tempo alegre, era tempo da festa da firma.

Após passar o ano inteiro explorando os pobres funcionários, principalmente os jornalistas, o dono do jornal decide promover uma festança. Para alguns, é um lampejo de humanidade do patrão, mas, para mim, é pura estratégia. Ele sabe que o jornalista é facilmente seduzido por uma boca-livre. Alimente um jornalista e ele se tornará seu amigo, dizia um filósofo de botequim. Ele esquecerá até que nunca lhe pagaram as horas extras trabalhadas.

A festa da firma é, portanto, um clássico exemplo da política “pão e circo”. Mas quem se importa com isso? Adoramos comida e bebida fartas, show com banda ao vivo e até sorteio de prêmios. Na minha época, começavam com brindes institucionais e acabavam com o prêmio máximo da noite, a cobiçada semana com a família numa colônia de férias em Mongaguá. Eu, que nessas ocasiões sempre preferi o pão ao circo, cheguei a criar um grupo de amigos batizado de “a nuvem dos gafanhotos”, que perambulava pelas mesas de comida deixando só devastação.

O evento de confraternização é uma excelente ocasião para os jornalistas interagirem com pessoas de outros departamentos, coisa rara, como a turma do administrativo e a turma do comercial, esta também chamada de “os vendedores de anúncio”. Quase todo jornalista vai à festa, até mesmo aqueles que nunca conseguem um alvará da patroa para as bebedeiras habituais pós-fechamento. Só não aparece a ala dos intelectuais, jornalistas que acreditam que a festa da firma não passa de uma forma primitiva de entretenimento, regada a axé music, cerveja e suor. Sociologicamente falando, é claro.

Na festa da firma, muita gente perde o pudor, se revela, paga mico ou arruma confusão, mesmo porque as taxas de sangue no álcool ficam baixíssimas. A vantagem de ficar um pouco sóbrio é poder testemunhar todas as aberrações da noite e ter matéria-prima para fofocar com os colegas no dia seguinte. Jamais esquecerei a festa em que o foca do caderno de Variedades, aquele moço tímido e de poucas palavras, foi subitamente arrebatado pela música do Abba, subiu na mesa, arrancou a camisa, rebolou como uma lagartixa e gritou: “I am the queen, I am the dancing queen!”. Depois disso, nunca mais foi visto na redação.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Jornalistas cornos, uni-vos


Ao abrir a caixa de e-mails pela manhã, notei uma mensagem com um assunto curioso: “Pena que você não mora em Rondônia”. Era de um amigo, do tipo “o engraçadinho da redação”. Não entendi o significado daquela frase, mas sabia que era alguma sacanagem.

O e-mail contava a história da Ascron, Associação dos Cornos de Rondônia, entidade fundada há 25 anos por jornalistas de Porto Velho para prestar auxílio a vítimas de traição. Para eles, o jornalista é mais vulnerável a uma pulada de cerca por trabalhar demais e deixar a mulher carente e sozinha em casa. Aí, o bicho, quer dizer, o Ricardão pega. Na Ascron, grande parte da diretoria é formada por jornalistas, alguns com cargos vitalícios. E tem gente que reclama que nossa categoria é desunida!

A Ascron é uma entidade sem preconceitos, aberta a todos os sexos: homens, mulheres e nossos colegas da editoria de Cultura. Aceita também chifrudos de outras classes profissionais. Já são cerca de 8 mil associados em todo o Estado. Um dos atrativos é o clube de benefícios. Os membros recebem uma carteirinha para descontos em estabelecimentos comerciais, como farmácias, mercados e salões de cabeleireiros especializados em polimento de chifres. Até taxista cobra menos dos cornos de Rondônia.

A idéia dos colegas de Porto Velho é realmente interessante e deveria ser copiada por outros Estados. Quem sabe algum dia eu ainda não funde uma unidade em São Paulo? Criaria também um trabalho assistencial com focas, a Fundação Euclidinhos da Cunha, para orientar jovens em seus primeiros pescoções e plantões de fim de semana a lidar com a cornitude com menos sofrimento. Nos preocupamos demais com as campanhas por melhores salários e nos esquecemos de lutar por benefícios aos cornos da redação, essa gente desamparada e alvo de chacotas.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

As mulheres que não comi


Todo homem gosta de revelar para os outros homens as mulheres que já comeu, mesmo que as tenha comido apenas na imaginação. Se o homem for jornalista, um natural contador de histórias (e de vantagens), as chances de tais aventuras íntimas se tornarem de domínio público aumentam. Quase todo jornalista do sexo masculino é ou já foi um grande comedor.

Lembro-me de um amigo que, certa vez, numa rodinha de homens na redação, gabava-se, eufórico, de ter acabado de transar com uma atriz internacional. Uma moça da Ucrânia lindíssima que viera ao Brasil para um festival de cinema. Entrevistou-a e, depois, foi visitá-la em seu hotel. Não parava de falar nela. Estava insuportável. “Ukraine girls really knock me out, they leave the west behind”, cantarolava pela redação, evocando os Beatles. “Duda, o que são essas mulheres do Leste europeu, meu amigo? Sensacionais!”

Embora eu seja um jornalista autêntico, contador de histórias (e de vantagens), sou pobre de aventuras sexuais. Minhas trepadas mais memoráveis são as que não aconteceram.

A empresária criminosa

Estava com uma história quentíssima nas mãos. Uma empresária bem-sucedida, gostosa e com fama de sedutora estava envolvida em um grande esquema de sonegação fiscal. E eu tinha provas. Encontrei-me com ela num café. Queria ouvir sua versão antes de publicar a matéria. Ela, então, me propôs uma noite de sexo selvagem em troca de meu silêncio. Eu disse que não me venderia por uma noite de sexo. Ela aumentou a oferta: um fim de semana de sexo selvagem em sua mansão de Angra dos Reis. Por alguns segundos, imaginei-me com ela numa banheira de hidromassagem, bebericando um champanhe francês. “Sinto muito. Sou um jornalista ético e com princípios. E, além disso, sou casado e fiel”, respondi. Publiquei a história, que gerou algum barulho. O Ministério Público e a polícia decidiram investigar a empresária, mas o caso foi arquivado pouco depois por conta de “provas insuficientes”. Aprendi que nem todos os homens recusam um sexo selvagem em Angra.

A nova estagiária

O dia em que a nova estagiária chegou à redação foi de grande tumulto, inclusive em meu coração. Logo me apaixonei pelo seu jeito meigo e por sua bunda. Naquela época, eu tinha uma namorada, mas não dava muita importância para essa coisa de fidelidade. Em pouco tempo, ficamos amigos. Eu ainda era foca, talvez dois anos mais velho do que ela, mas falava como se fosse o jornalista mais experiente do pedaço. Mas eu era um pouco imaturo e contava piadas estúpidas, como “o que é um ponto amarelo no alto de um prédio?”. Acho que ela só ria para não me deixar sem graça. Um dia a convidei para ir ao cinema e ela aceitou. Mas não apareceu e nem me deu explicações. Descobri depois que, naquela noite, ela havia ido a um restaurante chique com o editor-executivo do jornal, um homem que falava de vinhos e viagens internacionais, jamais sobre fandangos suicidas.

A jornalista gringa

Quando meu casamento acabou, estava decidido a comer todas as mulheres do mundo. A desforra. Numa coletiva de imprensa, conheci uma jornalista gringa que estava em São Paulo fazendo um documentário sobre a cidade para uma TV de seu país. Tinha um Inglês sofrível, mas era bastante interessante. “De onde você é?”, perguntei. “Da República Checa. Venho de longe. Leste europeu”, ela respondeu. Meu Deus, lembrei-me na hora do meu amigo! “Duda, as mulheres do Leste europeu são sensacionais!” Ela precisava de um guia para lhe apresentar a cidade e eu logo me dispus a desempenhar este papel. Ela adorou. Para impressionar, aluguei um carro com ar-condicionado e fiz um empréstimo no banco para financiar jantares e outros programas bacanas. Contei piadas mais inteligentes (nada de fandangos) e num segundo idioma. Ela ria, estava feliz. Eu ainda mais. Porra, vou comer uma mina do Leste europeu, pensava. Até que ela disparou: “Você é muito divertido. Minha namorada iria adorar você”. E me contou detalhes de sua vida sexual. Era 100% lésbica, não curtia um pinto de jeito nenhum! E eu levei alguns meses para acabar com as minhas dívidas.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Experiência única


Dias atrás, uma amiga, sabendo que tenho vivido de frilas, encaminhou à minha caixa de e-mails um anúncio de trabalho, cuja fonte é o blog http://mktcomunicacao.blogspot.com. Não sei se ela esqueceu que fiquei velho ou se quis me sacanear mesmo. Já não tenho mais a disposição dos jovens, embora conserve o bom humor para enfrentar a dureza de nossa profissão.

Reproduzo abaixo o anúncio, inclusive com os erros de Português, com os meus comentários em negrito. Em alguns trechos, o anúncio parece piada pronta e mostra que ser jornalista é viver, muitas vezes, grandes aventuras.


São Paulo/SP - Requisitos:

  • Graduação em jornalismo
  • Experiência em apuração de fatos e redação para web
  • Experiência em cobertura de eventos
  • Inglês fluente
  • Disponibilidade para viajar do dia 16 a 29 de novembro (SP-MG-SP)
  • Ter notebook é imprescindível (Todos os jornalistas, principalmente os mais jovens, têm notebook, com internet wireless.)
  • Espírito aventureiro, disposição, bom humor e gostar de esportes de aventura são diferenciais (Bom humor é diferencial, sim. Só rindo!)
  • Jornalista jovem e com muita disposição para auxiliar na cobertura jornalística online de um evento esportivo de grande porte no cenário internacional.
É necessário disposição e bom humor (Ai, que erro medonho de concordância) para trabalhar de forma ininterrupta (com revezamento nem sempre possível) no evento que ocorrerá durante 10 dias consecutivos. (A expressão “revezamento nem sempre possível” quer dizer que você vai trabalhar 24 horas por dia durante 10 dias!)

O lema do evento, para atletas e staff, é: "durma quando puder, coma quando puder, tome banho quando puder". (Como o lema dos jornalistas é “viva quando puder”, temos tudo a ver com este evento. Aliás, adorei a sinceridade do anúncio! Comer pra quê? Dormir pra quê?) Portanto, aceitamos CVs de profissionais que realmente queiram fazer a narração de 10 dias de competição (com bases móveis, estilo Rally dos Sertões), onde os atletas têm apenas 4 horas de sono obrigatório durante todo o evento. Experiência única. (Realmente tem de querer muito! Adorei também as “4 horas de sono obrigatório”!)

O trabalho é freelancer e oferece:

  • Verba de alimentação (Mas conseguiremos nos alimentar?)
  • Hospedagem durante a viagem para o evento (Mas conseguiremos dormir?)
  • Transporte de ida e volta para o local do evento (cidades históricas de Minas Gerais) (O que não vai faltar é igrejinha para rezarmos por dias melhores.)
  • Valor para 10 dias de cobertura online: R$ 750,00 (Ou R$ 75,00 por dia, o valor de uma boa faxina em São Paulo, com direito a almoço e dispensa às 17 horas para ver as novelas da Globo. Haja bom humor!)

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Eu? Na merda?


Nunca imaginei que iria encontrar Pedro Henrique, jornalista de hábitos refinados e fascinado pelo glamour, na fila da promoção do filme brasileiro do Cinemark a dois míseros Reais.

– E aí, PH, quanto tempo, hein? Pensei que você só ia a óperas...
– Que nada, Duda. Sempre fui um dos maiores apoiadores do cinema nacional.
Fiquei sabendo, por amigos em comum, que o cara tava falido. Não tinha grana nem para a pipoca.

– Como estão as coisas no jornal? Perdi contato com muita gente.
– Não estou mais lá. Decidi sair. Precisava de novos desafios profissionais.
Na verdade, ele tinha sido demitido. Por justa causa.

– E o que anda fazendo?
– Segui o caminho da comunicação corporativa, um sonho antigo.
PH fazia assessoria de imprensa, coisa que sempre detestou.

– Está em alguma agência?
­– Agência? Rapaz, virei um empresário de sucesso. Sou o big boss!
PH tinha uma empresa de um cliente só e nenhum funcionário. Era chefe de si mesmo.

– E teu escritório, onde fica?
– Então, Duda, até pensei em ter um escritório num centro empresarial badalado, mas optei pelo home office, um conceito mais moderno de trabalho.
Mentiroso desgraçado. Não tinha como pagar o aluguel!

­– Pô, PH, a gente precisa se ver mais, trocar umas idéias. Vamos marcar um café.
– Claro, Duda!!! Aliás, eu pago. Fiquei sabendo que você ainda tá desempregado... Bem, a gente se fala.
Até hoje aguardo este maldito café.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Imprensa livre. Pero no mucho


De seu gabinete no Palácio Miraflores, Hugo Chávez liga para o amigo Fidel Castro, em Havana. Chávez está revoltado com as críticas da SIP à Argentina.

– Mestre, você tem acompanhado a pressão daqueles dinossauros da SIP contra nossos irmãos argentinos?

– Aquilo é uma vergonha, Huguito! Só porque Cristina e Néstor criaram uma lei para controlar a mídia.

– Pobre Kirchner! Logo ele, um defensor da democracia, da liberdade de expressão. Enfim, um partidário de nossas idéias.

– Esta SIP só serve aos interesses dos yankees.

– Hoje em dia, os líderes não têm autonomia pra nada. Não se pode mais intervir numa emissora de TV, censurar um jornal, fechar umas rádios...

– Huguito, está cada vez mais difícil atender aos desejos do povo.

– Somos oprimidos pela imprensa do denuncismo! Cagam de medo da revolução bolivariana.

– A coisa tá feia na Bolívia e no Equador também.

– E essa praga de redes sociais? Blog, Twitter e sei lá mais o quê. Pra que tanta informação se já temos a imprensa oficial?

– Coisa de vagabundo, Huguito. Em Havana, tá cheio disso. Não posso nem mais jogar meu dominó em paz!

– São idiotas com mania de liberdade. Não respeitam nem os aposentados!

– E você, Huguito, anda sumido, hein? Venha pra cá tirar outras fotos comigo. Preciso mostrar ao mundo que ainda estou vivo.

– Vou, sim. Ainda nem conheço teu novo agasalho da Puma.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Obrigado, meu povo!


Uma combinação de admiração pelos meus textos e piedade (aliás, mais piedade) foi a resposta do público à questão Você compraria um livro com as histórias do Duda Rangel?, tema da última enquete. As alternativas "Sim, por que não dar uma chance a um pobre jornalista desempregado?" (50%) e "É claro, será um novo clássico da literatura mundial" (46%) quase emplacaram uma vitória unânime do "sim". Com os olhos lacrimijantes, queria agradecer a meus leitores o apoio!

Terminada a pesquisa, um amigo já me perguntou: “E aí, Duda, o que é mais fácil: você publicar o seu livro ou a moça da Uniban sair pelada na Playboy?”. Respondi que, se a oferta financeira da Playboy à moça for razoável (não precisa ser nem boa nem ótima), a segunda opção tem mais chance de virar realidade. Mas confio também no meu taco. Agora, com o apoio popular, sinto-me mais forte para contar minhas aventuras em livro.

Já vou começar a trabalhar duro para lançar o livro em 2010. Prometo não decepcioná-los e prometo também brigar para que a editora (será que alguma vai se interessar pelo meu projeto?) cobre um preço bem popular, afinal o público-alvo é formado basicamente por jornalistas. De repente, posso até pensar numa promoção, do tipo “Compre um livro do Duda e ganhe outros dez para distribuir para os amigos”.

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A nova pesquisa quer saber quem é o entrevistado ideal para o jornalista que busca uma matéria polêmica. Para responder a esta pergunta, não vale pedir ajuda à produção do programa da Luciana Gimenez, hein? As opções vão de Caetano, especialista em tombos e declarações bombásticas, ao rei Pelé. Entende?

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Jornalismo e cinema – parte 2


Como comentei no post anterior, outro filme de minha lista de preferidos é Lula e Mainardi na Terra Sem Sol, que mostra a saga e os conflitos internos de um humilde sertanejo.

No começo do filme, de inspiração glauberiana, Manuel estupra a cabrita de um poderoso coronel do sertão e, para não ser capado, foge para São Paulo, a Terra da Garoa e das enchentes nas Marginais. Ao chegar à Rodoviária do Tietê, acha um exemplar da Veja esquecido no banheiro. Com a ajuda de um faxineiro, que lê a revista para ele, Manuel conhece o jornalista Diogo Mainardi e seu ódio contra o presidente Lula, nordestino como ele.

Como pode este jornalista insultar alguém tão generoso como o Lula?, pensa Manuel. O sertanejo tem o presidente como um verdadeiro líder messiânico, o homem que operou o milagre do Bolsa Família nos rincões mais pobres do Nordeste. Manuel passa a odiar Mainardi e os demais jornalistas, esse povo do mal.

A grande mudança na história ocorre tempos depois, quando Manuel, ao andar sem rumo pelas ruas de São Paulo, se depara com uma manifestação de jornalistas por salários mais dignos. Percebe que os jornalistas são pessoas tão sofridas e miseráveis quanto a sua gente do sertão. Um detalhe interessante é que, para filmar esta cena, a responsável pelo elenco optou por jornalistas verdadeiros e não atores profissionais. Os “atores sociais”, como ela explicou no making of, têm uma cara de desgraça que funciona melhor no cinema.

Manuel vê que nem todos os jornalistas são arrogantes como imaginava ao conhecer Mainardi. Fica confuso e não entende quem, afinal de contas, representa o Bem e quem representa o Mal neste mundo. No fundo, Manuel quer ser apenas um homem livre, sem tanta gente poderosa a perturbá-lo. Quer viver em paz, com sua rapadura e com Geni, sua cabritinha de estimação.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Jornalismo e cinema


Existem certas obras do cinema a que todo jornalista deveria assistir, como Todos os Homens do Presidente, O Quarto Poder, entre muitas outras. Elas dispensam comentários. Há ainda filmes que, embora não tão famosos quanto os citados, estão na minha lista de preferidos. Um dos mais marcantes é, sem dúvida alguma, Corra que o Passaralho Vem Aí 3, um filme de suspense, com toques de drama.

O filme tem a assinatura de um antigo crítico de cinema que sonhava ser diretor. Após muito tentar, conseguiu. No fundo, todo crítico é um cineasta frustrado. Ele fez uma obra ousada, mas de baixo orçamento, toda ela filmada no corredor de uma redação de jornal. Os personagens interagem basicamente entre si e com uma máquina de café.

O passaralho, para quem não sabe, é o anúncio de corte de empregos. A chegada do passaralho cria um clima natural de tensão. Em meio ao desespero dos jornalistas que caminham para a lama surgem histórias pessoais belíssimas. A seguir, destaco uma das cenas que mais gosto do filme, a terceira, em que três jornalistas conversam ao lado da máquina de café. A partir deste momento toda uma história de angústia começa a se desenvolver.

CENA 3

Jornalista 1 (sujeito em pânico) encontra o jornalista 2 (mais calmo) ao lado da máquina de café. Eles conversam ao mesmo tempo em que preparam o café.

Jornalista 1: Você já está sabendo da última péssima notícia?

Jornalista 2: Cassaram nossa folga de fim de semana?

J-1: Antes fosse isso. Vão cassar os nossos empregos! Ouvi dizer que tem um passaralho novo vindo aí.

J-2: Pois é, eu também ouvi, mas parece que só vão mandar embora os jornalistas que ganham muito bem.

J-1: Pera aí: tem alguém que ganha muito bem nesta redação?

J-2: Ah, deve ter. Sabe os articulistas que ficam o dia inteiro sem fazer porra nenhuma interessante? Devem ganhar uma fortuna!

J-1: Será? Eu tô muito preocupado. Não posso perder meu emprego. Tô cheio de dívidas. Acabei de comprar um carro 1.0 em 72 vezes. (ele coloca um sachê de adoçante no café)

J-2: Café com adoçante? Você só come porcaria, tá gordo pra caralho e acha que este adoçante vai salvar a sua vida? Você já tá condenado, meu amigo. (sorriso sacana)

J-1: Acho que prefiro perder a vida ao emprego. (semblante ainda mais preocupado)

Neste momento, o jornalista 3 (sujeito alarmista) aproxima-se da máquina de café.

Jornalista 3: Caraca, fiquei sabendo que vão mandar 150 jornalistas embora aqui da redação!

J-2: Mas como vão mandar 150 se aqui só há 90 jornalistas?

J-3: Sei lá, é o que estão dizendo por aí...

J-1: Se estão dizendo, é melhor a gente ficar esperto! Ai, acho que tô com taquicardia...

É um filme realmente sensível e emocionante!


No post de sexta-feira, falarei de um outro filme da minha lista de preferidos: Lula e Mainardi na Terra Sem Sol, uma obra de inspiração glauberiana. Extremamente sutil e poético, o filme conta a história de Manuel, um retirante nordestino que chega a São Paulo após cometer um crime no sertão e, por acaso, passa a acompanhar o duelo entre um jornalista reacionário e um presidente populista. Trata-se naturalmente da velha metáfora da luta entre o Bem e o Mal, mas, neste caso, Bem e Mal se misturam, fazendo uma confusão da mulesta na cabeça do pobre sertanejo.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Os 12 trabalhos de Hércules


Hércules da Silva era um jornalista talentoso. Mas sua ascensão profissional despertou a ira de um editor do jornal em que trabalhava, que temia ser substituído pelo jovem. O editor preparou uma macumba das bravas e amaldiçoou sua carreira. Hércules pirou, virou um jornalista sem escrúpulos e foi demitido.

Ao recuperar a razão, estava sem rumo e sem emprego – não era mais aceito em nenhuma redação. Hércules, então, pediu ajuda a um recrutador de talentos, que lhe indicou uma agência de comunicação empresarial. Virou assessor de imprensa. Para reconquistar o prestígio profissional, precisou servir ao seu chefe em 12 árduas tarefas, com dedicação e coragem extremas, como um verdadeiro herói da mitologia grega.

1º Trabalho – Atendeu a seis contas de diferentes segmentos ao mesmo tempo, com a missão de não perder a sanidade mental.

2º Trabalho – Ficou dias inteiros ao telefone, fazendo follow up. Teve de vender pautas a jornalistas sem paciência de ouvi-lo. Resistiu a xingamentos ao ligar no horário do fechamento.

3º Trabalho – Acordou ao longo de meses de madrugada para fazer clipping de jornais e revistas. Privou-se de cafés da manhã.

4º Trabalho – Suportou uma reunião de briefing com o mais chato cliente da agência.

5º Trabalho – Passou quase um ano tentando emplacar um entrevistado que não tinha porra nenhuma de interessante para contar no programa do Jô Soares.

6º Trabalho – Enfrentou um almoço com jornalistas arrogantes, para estreitar relacionamento.

7º Trabalho – Travou uma luta com o gerente de uma conta para justificar por que apenas dois jornalistas tinham ido a uma coletiva de um cliente importante.

8º Trabalho – Convocou uma reunião de urgência com a imprensa, para que um cliente explicasse um escândalo de corrupção sem muita explicação.

9º Trabalho – Precisou convencer um executivo egocêntrico (cliente da agência) a não pedir ao jornalista que o entrevistara para ler a matéria antes de sua publicação.

10º Trabalho – Teve de comprovar o sucesso de uma campanha de imprensa por meio de um banal relatório de centimetragem.

11º Trabalho – Suportou o ataque selvagem de jornalistas ávidos por um jabá, ao desfilar por uma redação com uma sacola cheia de mimos de um de seus clientes.

12º Trabalho – Venceu a revolta de um grupo ensandecido de RPs, contrários à invasão de jornalistas na área deles.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Não deixe a notícia morrer


Um jovem jornalista tem poucas dúvidas em relação à palavra “suíte”. Ele sabe muito bem que se trata do local em que pretende abater alguma moça. Seu único dilema é decidir por uma suíte mais básica ou por uma suíte mais top, com hidromassagem e pista de dança. No jornalismo, “suíte” é algo bem diferente, é muito mais do que um quartinho de motel.

“Suíte” é o desdobramento do fato, o que acontece no dia ou nos dias seguintes à notícia. Muitas histórias começam hoje e, infelizmente, morrem logo depois, porque o jornalista não se preocupou em ir além ou não teve tempo. Ao contrário dos filmes franceses, que têm começo, têm meio, mas não têm fim, a história jornalística precisa de um desfecho.

Muitas notícias acabam numa nota ou num pronunciamento oficial. Um exemplo: policiais torturam e matam um inocente qualquer numa favela qualquer. Então o comandante do batalhão dá uma resposta qualquer à imprensa, diz que vai abrir uma sindicância interna (qualquer) para investigar os fatos. E a história acaba por aí. O jornalista não apura mais nada, nem fica sabendo se a sindicância foi realmente aberta.

Acompanhei histórias que duraram meses. Buscava elementos novos, interessantes. Algumas dessas histórias pareciam os velhos folhetins de jornal. Mas confesso que demorei um pouco para entender a verdadeira importância da suíte no jornalismo.

Quanto às suítes de motel, desde muito jovem nunca tive dúvidas. Um amigo, mais velho, me ensinou em quais ocasiões devemos optar por uma suíte básica e em quais devemos optar por uma suíte top. Tudo depende sempre, dizia ele, da beleza da moça, a famosa relação custo-benefício. Puta canalha!

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Jogo rápido


Um pingue-pongue sobre vida profissional e pessoal com um colega do jornalismo diário.

Um sonho: Escrever a matéria da minha vida, digna de prêmio.
Uma alegria: Chegar em casa tarde e encontrar minha mulher sozinha na cama.
Um medo: Que o editor filho-da-puta cancele minha folga.
Não saberia viver sem: A máquina de café da redação.
Uma mania: Reescrever o título das matérias dez vezes.
O que mais te irrita: Ligação de assessor de imprensa na hora do fechamento.
Uma ambição: Pagar todas as contas até o final do mês.
Uma virtude: A paciência. Há anos espero pelo plano de carreira do jornal.
Um defeito: Às vezes escrevo demais.
Deus: O cara que criou o céu, a terra e as estagiárias.
Diabo: O cara que criou o pescoção.
Um filme: Corra que o passaralho vem aí 3.
Uma música: Forró do Diploma (Você não vale nada, mas eu gosto de você).
Um livro: A Imprensa Livre, do poeta maranhense José Sarney.
Um blog: Desilusões perdidas, do Duda Rangel.
Um ícone da imprensa: Tenho dois: Duda Rangel e Zé Bob.
Família: É a base de tudo, para quem eu sempre peço dinheiro emprestado.
Filhos: Ainda não tive tempo de fazê-los.
A viagem dos sonhos: A que o caderno de Turismo me mandar.
Uma noite inesquecível de sexo: Não me lembro agora.
Uma frase: Em redação de jornalista PJ, quem tem carteira assinada é rei.
Jornalista é: Um louco, apaixonado pela profissão.
Em sua lápide estará escrito: Morreu na merda. Mas feliz.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Quem quer um livro do Duda?


Você compraria um livro com as histórias do Duda Rangel? Sim, você mesmo! Compraria um livro com as histórias deste humilde jornalista? Já há algum tempo, diversos leitores do blog têm sugerido a compilação dos posts do Desilusões perdidas em um livro impresso. Haveria ainda textos inéditos e talvez algum sensacionalismo barato para aumentar as chances de venda.

Eu, que sou um sujeito democrático, resolvi ouvir a voz do povo. Esta é, portanto, a nova enquete, que já está no ar.

Confesso que, desde criança, sonho escrever um livro. Mas nunca me achei um cara capaz. Comecei a rever minha posição depois que a Bruna Surfistinha se tornou um sucesso editorial. Pensei: “Porra, se ela que é puta conseguiu lançar um monte de livros, eu que sou jornalista também consigo. Não acho que as putas sejam melhores ou mais capazes que os jornalistas”. Desde então, passei a confiar mais em meu potencial literário.

Se a idéia do livro vencer a enquete, prometo até fazer um lançamento minimamente decente da obra numa livraria. É claro que será um evento bem modesto, sem o furor e o glamour de um lançamento de livro do Chico Buarque. Não esqueçam que sou um jornalista bem pobre (desculpem a redundância). Mas garanto, ao menos, um prosecco ordinário e baconzitos genéricos. O Nestor poderá estar presente ao evento, desde que prometa, é claro, não fazer xixi na estante de livros de auto-ajuda. Votem em mim!

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Atire o primeiro bloquinho de anotações ou gravador o jornalista quem nunca deu uma carteirada na vida. Quem, em seu dia de folga, nunca disse “tô trabalhando, meu amigo, tô trabalhando” com aquela preciosidade plastificada da Fenaj nas mãos? A enquete que acabou de acabar – Qual a prática mais comum adotada por um jornalista para levar vantagem financeira? – teve a vitória da opção “Dar carteirada para entrar em algum evento sem pagar”, com 45% dos votos. A alternativa “Ir a uma boca-livre para economizar a grana do almoço (do jantar, café da manhã)” ficou em segundo, com 33%.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Jornalista, um caso clínico


Por não ter uma vida saudável, o jornalista fica mais vulnerável a doenças. Algumas são típicas da profissão. Patologias que derrubam, principalmente, os colegas de hard news, incapazes de criar anticorpos para combater a rotina maluca de trabalho.

Ricardite crônica ou Mal de Euclides da Cunha

Esta enfermidade afeta jornalistas que viajam muito, fazem plantões de fim de semana ou pescoção até a alta madrugada. As vítimas costumam reclamar de dores fortes na cabeça. Em estágios avançados da doença, alguns relatam casos de alucinações, sobretudo quando chegam em casa mais cedo. Um jornalista afirmou ter notado sapatos desconhecidos em seu quarto. Outro garantiu ter visto o vizinho em sua cama, ao lado de sua mulher. A desinformação aumenta os casos da doença, afinal a vítima é sempre a última a saber o que acontece em sua casa.

Estrelíase aguda ou Síndrome de Bozó

Este mal, de raiz egocêntrica, ataca jornalistas que trabalham em TV, em especial em grandes emissoras. São pessoas que passaram do anonimato à fama de forma rápida e ainda não conseguiram controlar as altas taxas de estrelismo no sangue. O nariz de quem é acometido pela patologia tende a ficar um pouco arrebitado. Mas o sintoma mais claro que o jornalista está doente é quando ele sai bradando a todos os cantos que é o fodão, que tem acesso a qualquer entrevistado, um puta salário e o escambau. Em casos mais graves, o paciente vive o dia inteiro com o crachá da emissora pendurado no pescoço.

Distúrbio da Sociabilidade Reprimida

Espécie de fobia social, atinge jornalistas que, por trabalharem muito, só conseguem se relacionar com outros jornalistas. Eles não têm tempo livre para interagir com seres humanos de outras profissões. Vivem em guetos. São neuróticos. Andam com o celular ligado 24 horas por dia. Só pensam em trabalho. Nos raros momentos de folga, entram em pânico quando se encontram fora de seu hábitat natural de lazer, o bar próximo à redação onde trabalham. Há relatos de um jornalista que, na cama de um motel com uma dentista gostosa pra cacete, teve uma crise de choro na hora H, pois precisava acabar uma matéria para o dia seguinte.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Mardita calabresa!


Um esporte bastante praticado pelos jornalistas é a "corrida atrás de emprego". Para quem trabalha, é o "triatlo de redação", modalidade de resistência em que o repórter apura a matéria pela manhã, vira redator à tarde e ajuda no fechamento à noite. Mas, no geral, nossa vidinha é bem sedentária. Uma pesquisa nacional do Comunique-se mostrou que apenas 3 em cada 10 profissionais da área cuidam do corpo de forma adequada.

Jornalistas, em sua maioria, preferem atividades intelectuais, como o debate de idéias num boteco, com cigarro, cerveja e uma porção de calabresa acebolada. Tudo muito saudável. Eu faço parte desta turma de malhação. Sempre tive uma vida desregrada e detestei academia - jornalista está acostumado a levar ferro e não a puxar ferro.

Não tomo Herbalife, nem sou adepto de nenhuma dieta de chá colorido. Sigo a Dieta do Desempregado. Como não tenho dinheiro para ir ao mercado, minha geladeira vive vazia. Logo, estou comendo menos. Quando trabalhava, eu seguia a Dieta da Coxinha, minha companheira de muitos almoços.

Existem, porém, alguns poucos jornalistas preocupados com o corpo e, principalmente, com a saúde. Conheci um novato em Esportes, que, de tão hipocondríaco, decidiu procurar um especialista em distúrbios do sono depois de uma noite em claro em seu primeiro pescoção. Tinha um outro, repórter de Cultura, que fazia exame da próstata desde os 20 anos. Ele dizia que era um cara prevenido, que se sentia protegido ao lado de um urologista de confiança e coisa e tal.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

O jornalista PJ


Direito trabalhista é uma coisa que todo jornalista já ouviu falar, mas não lembra exatamente o que é. É algo distante, que escapa à memória. É como um velhinho de 90 anos tentando resgatar o significado da palavra “sexo”. Ele só sabe que era bom.

Assim como os velhinhos desaprenderam a trepar, os jornalistas desaprenderam a ter FGTS, 13º salário, férias remuneradas. Vivemos a ditadura da “pessoa jurídica”. FGTS virou um artigo de luxo. E o pior de tudo é que, com um índice de desemprego tão alto, feliz é o jornalista que consegue, ao menos, emitir uma nota fiscal no fim do mês.

Eu só lembro que existe o tal direito trabalhista em tempos de eleição. Ligo a televisão e, no horário eleitoral gratuito, vejo o Campos Machado (ai, credo) e outras figuras nada agradáveis do PTB evocando Getúlio Vargas e todas as conquistas trabalhistas de décadas passadas. “Se você, meu caro eleitor, tem hoje um 13º salário, é graças ao PTB”, explica o Campos Machado. E quem disse, seu desgraçado, que eu tenho 13º salário?

Há redações e agências inteiras dominadas pelas pessoas jurídicas. Se você ainda não é um jornalista PJ, meu amigo, tudo é uma questão de tempo. Uma dica para estes felizardos que ainda têm carteira assinada é jamais pedir um aumento salarial ao chefe. Se o chefe for o dono da empresa, pior ainda. É grande a chance de ele lhe responder: “Eu até posso aumentar o seu salário, mas você terá de emitir nota. Aliás, ótima idéia! Você terá seu aumento merecido e, a partir de agora, trabalhará como PJ. Estes encargos trabalhistas ainda levarão a empresa à falência. Neste país ninguém tem compaixão pelos empresários.

Então, só lhe restará procurar um contador de sua confiança.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

O post dos porquês


Por que o Globo Repórter só fala de bicho e de cuidados com a saúde? Por que o piso salarial do jornalista é muito mais piso do que o piso de várias outras profissões? Por que o jornal de domingo tem mais anúncio de empreendimento imobiliário do que notícia interessante? Por que pauteiros e assessores de imprensa nunca se entendem direito? Por que a cobertura da Semana Santa, do Natal, do Dias das Mães é todo ano igual? Por que as faculdades de jornalismo são, em sua maioria, tão ruins? Por que o Diogo Mainardi não vira correspondente no Afeganistão? Por que só existem as “moças do tempo” e nunca “os moços do tempo” nos telejornais? Por que o César Tralli chega sempre antes? Por que o faro jornalístico e a investigação sucumbiram ao Google? Por que o jornal de ontem causa tanta repugnância? Por que o Márcio Canuto berra no microfone? Por que grande parte dos jovens jornalistas odeia ler jornais e revistas? Por que as legendas das fotos da Folha de S.Paulo são tão óbvias? Por que o Amaury Jr. cobra tão caro por uma entrevista? Por que quando a pessoa nasce Deus tem de perguntar se ela quer ser jornalista ou ganhar muito dinheiro na vida? Por que os jornalistas têm tantas ilusões? Por que os jornalistas não sabem lidar com as suas desilusões?

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A mala do Comercial


Edgar é gerente de Comunicação de uma empresa de aromatizantes, também utilizados em preservativos masculinos. Ele detesta os “contatos publicitários” de revistas segmentadas, "predadores que adoram marcar um cafezinho e fazer ligações inconvenientes", segundo ele.

– Edgar?

– Sim.

– Oi, querido. É Vandinha, da Sexo & Saúde.

– Sim.

– Tenho uma proposta irrecusável.

– Sei.

– Vamos lançar uma edição especial dos 20 anos das Camisinhas Long Dong.

– E?

– E vocês, como parceiros de negócios, têm de fazer um anúncio de homenagem.

– Não tenho verba.

– Vocês vão ganhar uma matéria na página ao lado. É só enviar um release pra gente. Vai ser uma edição show.

– Meu orçamento já estourou.

– Meu amor, todos os grandes fornecedores da Long Dong já anunciaram. Vocês não podem ficar de fora.

– Anunciamos em outras publicações.

– Mas há quatros meses não fecham nada com a gente.

– Há muito tempo não sai nada de nós na revista.

– Ah, querido, é que nosso jornalista é um garoto novo, que acabou de entrar na editora. Vou dar um puxão de orelhas nele (riso sarcástico).

– Bom, de qualquer forma, agora não tenho como anunciar.

– Estamos com uma tabela promocional. São só 10 mil reais pela página inteira.

– 10 mil reais???

– É uma edição especial.

– Impossível!

– Vocês merecem um espaço de destaque.

– Não dá!

– OK, lindo, pra você eu fecho por 2 mil e quinhentos.

Alguns segundos de silêncio.

– Tá bom, tá bom, eu fecho o anúncio (de saco cheio).

– Que ótimo! Eu sabia que você ia aceitar...

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

A boa vida do vestibulando de jornalismo


Dia de vestibular é um martírio para muitos estudantes. Jovens enfrentam momentos de angústia. São acometidos por um mal-estar de grandes proporções, o tal cagaço. Estão cheios de dúvidas. Será que deixei de estudar alguma coisa? A que horas devo chegar ao local da prova? Já vou comido? Uso roupas leves? Será que não esqueci nada? Documentos? Caneta? O amuleto da sorte? A cola? Em comparação com estudantes de outras áreas, o vestibulando de jornalismo tem até algumas vantagens. Abaixo, veja três bons motivos para fazer uma prova tranqüila:

1) Você, que quer estudar jornalismo, não vai encontrar um monte de japonês debruçado sobre as folhas da prova, comum nos cursos de Medicina e Mecatrônica. Você não terá a desagradável sensação de ser devorado por um CDF que passou o ano inteiro estudando enquanto você estava bebendo com os amigos ou no Orkut. No dia da prova, nada pior do que ver um cara respondendo a todas as questões freneticamente enquanto você luta para vencer aquele “branco” que te deixou imóvel, com o olhar perdido no teto e a caneta na mão.

2) Para os homens, além de não topar com um CDF, há uma grande chance de você encontrar ao seu lado "a gostosa", tipo modelo e atriz, que sonha fazer jornalismo para ser apresentadora de TV e ficar famosa. São meninas que, no dia do vestibular, costumam se vestir de forma bem confortável, com shortinho e um top que deixa à mostra a barriguinha sarada com um piercing no umbigo. Só de imaginar que essa moça pode ser sua companheira de classe fará você relaxar (mas sem gozar). Alerta: cuidado para não perder muito a concentração e fazer um monte de merda no teste.

3) Com o fim da obrigatoriedade do diploma, a tendência é por um menor interesse pela carreira de jornalista. Na USP, por exemplo, jornalismo é hoje o sexto curso mais procurado; em 2008, era o primeiro. Ou seja, “com menas concorrência”, como diria o presidente Lula, você tem mais chances de entrar em uma universidade do Estado. Não precisaria, assim, vender rifas ou pedaços de bolo para pagar uma faculdade privada. Pra que gastar grana para comprar um diploma que não tem mais valor se você pode fazer o mesmo com o dinheiro público?

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Mainardi x Galvão: briga de cachorro grande


Bem, amigos do Desilusões perdidas. Diogo Mainardi, com seu estilo pitbull egocêntrico, superou Galvão Bueno no quesito "figura mais insuportável da imprensa brasileira". Na última enquete deste blog, o colunista da revista Veja ficou com 31% da escolha dos leitores contra 27% do narrador global, famoso por falar tantas abobrinhas. Vale lembrar que, além da dupla, havia mais seis concorrentes na disputa.

A briga foi acirradíssima, voto a voto, praticamente um empate técnico, afinal Galvão Bueno, o homem que comparou o cérebro humano a uma caixa de catupiry, é quase imbatível em chatice. Mas Mainardi, jornalista obstinado em derrubar o presidente e satanizar seus rivais, venceu, não escapando dos clicks furiosos de muitos internautas.

Da chatice passamos para questões de sobrevivência. A próxima pesquisa deseja saber qual é a prática mais comum adotada pelo jornalista para levar algum tipo de vantagem financeira. Nessas horas, vale tudo, de carteirada à decisão de se filiar ao sindicato da categoria para conseguir um plano de saúde de graça. O negócio é se dar bem! Vamos aos votos.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Bloquinho ou gravador?


Quando a gente fica velho, vez ou outra se pergunta como pôde ter sentido, na juventude, tanto medo idiota por coisas banais. Simplesmente porque, na ocasião, certas coisas não eram tão banais assim. Hoje, eu rio disso tudo. Talvez esta seja uma das vantagens de ficar velho: rir dos medos idiotas da juventude.

Era a tão esperada e temida véspera. Na manhã seguinte, eu, um pobre estudante de jornalismo, faria a minha primeira reportagem, para o modesto jornal da faculdade. As vésperas sempre me deixavam ansioso. Era assim desde os tempos de criança, quando eu assistia à missa do galo na tevê esperando o Natal chegar. Naquela noite, além de ansioso, eu estava tenso, com um medo danado de fazer merda. Minha mente viajava...

Não posso esquecer de pegar mais de uma caneta! Na hora H, a caneta sempre falha e a gente fica com cara de bobo. Então o entrevistado dá risada do foca atrapalhado. Isso não pode acontecer! E será que eu levo só um bloquinho de anotações ou um gravador também? Um jornalista experiente me disse, certa vez, que o bloquinho é melhor, porque faz a gente prestar mais atenção nas palavras do entrevistado, consegue captar a essência da matéria. É isso, vou levar só o bloquinho. E se eu não entender a minha letra no bloquinho? Minha caligrafia é péssima! Está decidido: vou levar o gravador. Mas peraí: será que não vou acabar dependente de uma máquina, de um gravador? Meu Deus, tenho de aprender a fazer uma letra mais decente. É, vou levar só o bloquinho. Mas, e se o entrevistado disser que eu escrevi várias mentiras, que ele não disse nada daquilo que está no texto e resolver me processar? Com o gravador, posso provar que ele disse tudo aquilo, sim! E agora?

Resolvi levar o bloquinho e o gravador. Só para garantir. A minha única (e grande) mancada foi esquecer de verificar se as pilhas estavam no gravador. Na hora H, o negócio não funcionou. O entrevistado caiu na gargalhada. Puta sacanagem com um foca atrapalhado. Então eu usei só o bloquinho. Minha letra ficou, naturalmente, horrível, mas aprendi que é bem melhor mesmo prestar atenção nas palavras, captar a tal essência.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

As lambanças do caso Letterman


Já imaginaram se nos meios de comunicação do Brasil funcionários descontentes com o trabalho ou atolados em dívidas decidissem chantagear os figurões da empresa com a ameaça de revelar suas peripécias sexuais fora do casamento? Haveria muita gente borrando as calças de medo. Nos Estados Unidos, um caso ganhou repercussão mundial: a extorsão a David Letterman, apresentador do programa de entrevistas “Late Show”, da CBS.

A história ainda está muito estranha. O acusado da chantagem é o jornalista Robert Halderman, um produtor de 51 anos, 27 deles dedicados à emissora de TV. Halderman teria pedido um cheque de US$ 2 milhões a Letterman, que é casado, para não tornar público um caso do apresentador com Stephanie Birkitt, de 34 anos, sua ex-mulher e antiga colega de trabalho de Letterman. Como um cidadão exige o pagamento por um crime em cheque? Nem os chantagistas portugueses cometeriam tal deslize.

Halderman teria usado o diário de Stephanie como “prova do crime”. Não entendo também por que uma mulher casada, de mais de 30 anos, escreve todas suas traquinagens extraconjugais num diário, como uma adolescente apaixonada. Se não estava mal-intencionada, deve ser muito burra.

A lambança final foi de Letterman, que, durante seu programa, confessou ser vítima de extorsão e de já ter tido algumas aventuras sexuais com moçoilas de sua equipe, sem citar nomes. Por mais nobre que tenha sido o ato, em tom de arrependimento, a confissão causou desconforto entre as jovens, algumas delas casadas. Todos querem saber agora quem foram as outras amantes do velhinho tarado.

No meu caso, a vantagem de ser apenas um jornalista latino-americano sem dinheiro no banco é talvez nunca correr o risco de sofrer este tipo de extorsão. Até porque nenhuma jovem ambiciosa vai se interessar por um cara sem pistolão.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

O netinho querido da vovó


O Nestor resolveu ficar doente justamente no nosso fim de semana. Começou a chorar de forma estranha no sábado à noite. Levei o pobrezinho a um hospital veterinário 24 horas e gastei lá o dinheiro do almoço do domingo. E o do resto da semana também. Na sala de espera, havia muitos cães, um cheirando o rabo do outro, na maior confraternização. Uma velhinha, com um chihuahua chato no colo, puxou assunto. Aliás, velhinhos adoram puxar assunto, assim como chihuahuas adoram ser chatos.

- Ah, então o senhor é jornalista? O meu netinho também é. O senhor trabalha onde?

- No momento, estou buscando novos caminhos, me reciclando, estudando muito, me redescobrindo como jornalista...enfim, estou desempregado, minha senhora!

- O meu neto também. Acabou de se formar e não consegue emprego de jeito nenhum. O menino é inteligente, fala Inglês fluentemente, mas não arranja nada. Dá para acreditar?

Não é a primeira vez que eu conheço alguém que tem parente jornalista. Até uma faxineira que trabalhou lá em casa tinha um sobrinho jornalista. Também era inteligente e não tinha emprego. Só não lembro se falava Inglês.

- Vou pedir para o meu neto mandar o currículo para o senhor. Talvez possa ajudá-lo. O menino é muito bom, inteligente...

Na semana seguinte, recebi um e-mail do moço, “o neto da velhinha do veterinário”, como ele mesmo se apresentou. Era um currículo enxuto demais, como também era o meu quando me formei. Mas o que mais me chamou a atenção – e me assustou – foi a “experiência profiCional”, com “c”. O netinho querido poderia até dominar o Inglês, mas o Português estava sendo duramente castigado. Mas avó é sempre avó, não é?

PS: Naquele sábado à noite, o veterinário disse que o Nestor estava ótimo. Era apenas manha canina. O danado me fez comer miojo por uma semana!

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Sapato neles


O jornalista, esse cara versátil e criativo, já está se especializando em uma nova atividade: o arremesso de sapatos em personalidades desagradáveis. Tudo começou no ano passado com aquele iraquiano maluco, o precursor mundial da modalidade, que presenteou George W. Bush com um par de “pisantes voadores”. Agora, foi a vez de um estudante turco, repórter de um pequeno jornal esquerdista, mandar o seu sapato (apenas um pé) na direção do diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn. Ambos mostraram, porém, uma enorme falta de pontaria, incrível semelhança com o ataque do Fluminense.

No Brasil, ainda nenhum jornalista-arremessador de sapatos em personalidades desagradáveis despontou. Somos sempre carentes de ídolos. Dirão que é por falta de incentivo do poder público, mas eu duvido. O que não falta é gente do poder público pedindo para levar um sapato na orelha. O Gilmar Mendes, por exemplo, vive dando bobeira nas sessões do Supremo. E cadê o nosso jornalista-arremessador para fazer o serviço? Acredito que o Maluf até gostaria de receber uma sapatada, mas desde que fosse, é claro, um clássico 752 da Vulcabras, com sola de borracha.

Eu, que na escola fui campeão de arremesso de bolinhas de papel nas costas do CDF da classe, até poderia me arriscar nesta nova carreira, mas, diante de minha precária situação financeira, a idéia seria uma grande loucura. Só tenho um par de sapatos. Torço, contudo, para que algum outro jornalista brasileiro tome a iniciativa e faça bonito no cenário mundial. Brasileiro é um povo talentoso. Acertaríamos o alvo em cheio e seríamos responsáveis pela criação do “arremesso de sapato-arte”. Alguém se habilita?

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

O fanático jornalista esportivo


Pedro Augusto, antigo colega da imprensa esportiva, é um daqueles sujeitos que só sabem falar de um assunto: futebol. O dia inteiro, em qualquer lugar. Na infância, acompanhava jogos pelo rádio - era fã dos grandes locutores - e ia sempre ao estádio com o pai. Adorava jogar futebol de botão e conseguiu completar o álbum da Ping Pong da Copa de 82. Até hoje, gaba-se de ter sido o único garoto da escola a ter a figurinha do craque polonês Boniek.

Na adolescência, os colegas diziam que, quando ia ao banheiro, preferia carregar uma revista Placar a uma Playboy. Sempre sonhou ser um jornalista de Esportes. Tornou-se um estudioso da área. Foi o primeiro cara que conheci que assistia aos jogos do Campeonato Holandês. Está por dentro de todas as regras, analisa esquemas táticos, organiza estatísticas de competições pelo Brasil, do Sul até o Acre. E o pior: adora ficar demonstrando todo o seu conhecimento. "Vocês sabiam que quem marcou o primeiro gol do Brasil em Copas do Mundo foi o Preguinho, em 1930?" Chato pra caralho!

O futebol para o Pedro Augusto não é apenas o seu trabalho. É a sua vida. Num plantão de domingo, após fazer a matéria de uma partida no estádio e voltar para a redação para ver os gols da rodada com os amigos, chegou em casa e foi assistir ao VT de Vasco x Fluminense, um zero a zero de dar medo. Não sei como a mulher do Pedro o agüenta. Aliás, não sei como ele consegue conciliar tanto fanatismo pelo futebol com seu casamento. Eu, por muito menos, fui trocado por um office-boy.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Procura-se um personagem desesperadamente


Depois de encontrar dinheiro para pagar o aluguel em dia, uma das maiores dificuldades enfrentadas por um jornalista é encontrar bons personagens para ilustrar uma matéria. Se falta a pessoa certa para dar o tempero para a história, o texto fica desinteressante. Uma matéria sem bons personagens é como uma mulher divorciada sem um bom advogado.

Uma prática comum para encontrar bons personagens é o famoso e-mail para a lista de amigos. “Caros, vocês conhecem alguém que tenha alguma coleção exótica, tipo VHS pornô ou animais peçonhentos empalhados?” O e-mail, às vezes, tem um tom de suplício. “Preciso de alguém que já tenha tentado o suicídio! Me ajudem, pelo amor de Deus, tô fechando a matéria. Se não encontrar alguém bacana, acho que eu corto os meus pulsos.”

O melhor dos mundos é quando o jornalista já conhece o personagem. Basta pegar o telefone e ligar para tal pessoa. Ainda assim, em algumas situações, a tarefa pode ser árdua.

Produtor de TV: Paulo, tudo bem, meu amigo? É o Sérgio.

Potencial personagem (PP): E aí, Sergião, o que manda?

Produtor de TV: Cara, é o seguinte: tô desesperado atrás de um personagem para uma matéria e eu preciso de um depoimento urgente seu!

PP: Sobre?

Produtor de TV: Sobre homens que têm casamentos heterossexuais, mas que já mantiveram um caso extraconjugal homossexual.

PP: Porra, cara, e você quer que eu exponha isso na televisão?

Produtor de TV: Você é a única pessoa que eu conheço que já passou por essa situação.

PP: Mas a minha mulher nunca soube! Quer acabar com o meu casamento?

Produtor de TV: Cara, você não precisa se identificar. A gente muda o seu nome, coloca você sentado de ladinho, na penumbra, altera a sua voz.

PP: Sergião, você é meu amigo, mas não vai rolar.

Produtor de TV: Caralho, vai me deixar na mão? Quando você pedia o meu apartamento emprestado para encontrar o seu namoradinho, eu nunca te neguei! Lembra disso?

Pausa para reflexão...

PP: Tá bom, tá bom, eu falo. Não precisava pegar tão pesado!

Produtor de TV: Só me diga o local da entrevista que o repórter voa para lá.

PP: Pode ser no parque.

Produtor de TV: Grande garoto!

PP: Ah, e vê se não esquece de colocar aquela voz de pato em mim, hein?

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Os mais insuportáveis


A nova enquete deste blog quer saber qual a figura mais insuportável do jornalismo brasileiro, pelas razões mais diversas. Trata-se daquele jornalista que te faz virar a página do jornal ou da revista com maior rapidez ou mudar de canal imediatamente.

Você só “suporta” ler ou ouvir um jornalista insuportável quando está a fim de ficar um pouco indignado, num clássico caso de autopunição premeditada. A lista de candidatos poderia ser, naturalmente, mais longa, mas decidi pegar os tipos mais representativos da categoria.

A pesquisa que acabou de ser encerrada – Qual a saia-justa mais cruel para um apresentador de telejornal? – teve vitória tranqüila da alternativa “Sofrer uma crise de tosse ou de riso no meio do programa”, com 59% dos votos. Nesta opção ainda poderia ser incluído o mico de comer bolacha no ar, ao vivo. Na TV Globo, isso costuma dar demissão.

Em tempo: na próxima segunda-feira, estará no ar o 100º post deste blog. Nunca imaginei que chegaria tão longe. Mas cheguei. Agora, mais valente, já começo a acreditar que posso alcançar o milésimo post, assim como Pelé alcançou o milésimo gol e o José Mayer alcançou a milésima mulher a pegar numa novela.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Curso rápido de jornalismo para idiotas


“Diploma não é necessário. Para trabalhar como Jornalista, faça um curso rápido”. É dessa maneira que a empresa Cursos 24 Horas anuncia treinamento para pessoas interessadas em trabalhar com jornalismo na Internet. Com custo de R$ 40 e duração de 45 horas, o curso promete formar “um Cyber Repórter de sucesso”.

O texto acima é a abertura de uma matéria do Comunique-se, publicada dias atrás e assinada por Sérgio Matsuura. Como sou um sujeito curioso, resolvi buscar mais detalhes do curso na página da empresa na web e me deparei com os tópicos principais das aulas (que são mais de 20). Há um pouco de tudo, desde “Criando uma Agenda de Fontes” a “Ganhando dinheiro no ramo de Jornalismo On-Line”. Os pré-requisitos para o curso: NENHUM. Acho que até o Nestor poderia fazer a sua matrícula.

Sempre acreditei que um curso de quatro anos é muito tempo para estudar jornalismo. Eu, por exemplo, passei metade do meu curso no boteco ou tentando comer as gostosas que estudavam Publicidade. Mas um curso de 45 horas também é uma piada. E de mau gosto. Daqui a pouco, vai ter escola divulgando o método Sleeping Learning. Aprenda jornalismo dormindo! Será que dá para sonhar com um lead perfeito ou um texto redondinho?

Outro aspecto pitoresco desta história do curso em 45 horas é a capacidade do brasileiro de se adaptar às novas regras para ganhar dinheiro fácil. É tudo uma questão de oportunidade. Não duvido que vai ter um monte de mané pagando quarenta paus para se tornar um “cyber repórter de sucesso”. E a empresa vai se dar bem. Por que eu nunca tenho essas sacadas geniais de negócio? Definitivamente, não sei ganhar dinheiro. Ou seja, sou um autêntico jornalista!

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

O velório


Apesar da vida desregrada, Almeida teve uma morte banal, atropelado por uma bicicleta. Repousava, agora, num caixão, enquanto poucos conhecidos chegavam para o velório. Deitado na mesma posição havia horas, sem se mexer, já sentia dores nas costas. Aquele algodão no nariz também o incomodava. De olhos fechados, não via ninguém, mas podia escutar tudo ao seu redor. Reconheceu a voz de alguns colegas de redação.

- Era um excelente jornalista, mas sempre se achou o único repórter capaz de fazer a cobertura policial, afirmou Carlão.

- Como se gabava ao dizer que era amigo de delegados, que tinha entrevistado os criminosos mais perigosos, emendou Jurandir.

- Contava que recebia ameaças de morte só para ter privilégios do jornal, completou Pedrosa.

Almeida ficou pálido, mais do que já estava. Então era essa a imagem que os colegas tinham dele? Para falar mal, que ficassem em casa. Ou no jornal, com suas pautas ordinárias. Tinham, sim, inveja de seu faro apurado, de suas fontes secretas, dos inúmeros furos, do sucesso com as mulheres.

- Era um conquistador barato, lembrou Ritinha. Diziam que, quando bebia então, não dava no couro.

Aí já era demais. Não respeitavam nem um defunto. Por que tanto rancor? Cansado, Almeida desejava virar para o lado e colocar um algodão também nos ouvidos, antes que chegassem ao velório seu chefe e sua ex-mulher. Nessas horas, o melhor a fazer é descansar em paz.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Engarrafados


São oito horas. Em meu carro popular, sem ar-condicionado, sou mais uma vítima anônima dos engarrafamentos de São Paulo. É dia de chuva e de um frila que não posso perder. Ligo o rádio e sintonizo aquela famosa emissora especializada em trânsito. Já são mais de 100 quilômetros de lentidão na cidade. Que merda, penso. Vou chegar atrasado. Se chegar, é claro.

A rádio, embora preste um importante serviço jornalístico, me deixa deprimido toda vez que a escuto. É só desgraça. Caminhão quebrado na Bandeirantes, pontos de alagamento nas Marginais, acidente com curiosos na zona leste, algum protesto bloqueando a Paulista. Os ouvintes também participam, por gravações de voz ou torpedos. Competem para saber quem tem a pior história para contar. Isso que é jornalismo colaborativo.

Os repórteres da rádio dão dicas de rotas alternativas, mas nem sempre é possível escapar do caos. O negócio é ter paciência, uma virtude que desconheço. Nessas horas, não sei o que é pior: ouvir aquelas buzinas insuportáveis dos motoboys ou respirar o escapamento dos caminhões. Eu também detesto a sensação de ser observado pelos motoristas ao lado. Não se pode mais falar sozinho em voz alta ou retirar uma catota do nariz em paz.

O tempo passa, e minha ansiedade aumenta. Por que não fui de transporte público? Seria melhor? Olho o relógio e o marcador da temperatura de meu carro, que começa a subir. Só falta meu velho companheiro me deixar na mão agora! O apresentador da rádio tenta amenizar o sofrimento dos ouvintes com seu bom humor e curiosidades da metrópole.

– Vocês sabem por que o complexo do Cebolão, na ligação dos rios Tietê e Pinheiros, leva este nome? Porque suas várias pontes, umas sobre as outras, são como camadas de uma cebola.

Desligo o rádio. O que me resta é rezar. Do meu carro popular, sem ar-condicionado, surge uma fumaça estranha. Um cheirinho de churrasco. Acho que terei de atrasar o aluguel do meu apê de novo. Culpa do trânsito!

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

O sanatório – parte 2


Meu amigo foi um jornalista brilhante, texto impecável, faro apurado, mas tinha um grande defeito. Sempre achava que os outros jornalistas queriam roubar as suas pautas. Na redação, vivia debruçado sobre o computador para que ninguém descobrisse o que estava escrevendo. Recusava-se também a assinar matérias com os outros colegas. Era soberano em suas reportagens e textos. Essa era sua esquisitice.

Começou a ficar com fama ruim na redação, mas não deixou de ser um grande jornalista e nem perdeu o meu respeito. E, agora, após muito tempo sem notícias suas, soube que estava no sanatório. O enfermeiro me contou que ele era um dos pacientes mais agitados e, por esta razão, era sedado vez ou outra. Nosso reencontro foi emocionante, ele chorou muito quando me viu.

- Fiquei sabendo que você é o agitador do pedaço, brinquei. Continua fazendo muita bagunça, como nos velhos tempos?

- Duda, estou com um problema sério aqui.

- Problema sério?

- Tenho um plano de fuga sensacional, arquitetado há meses. Coisa de profissional, sabe? Mas os outros internos querem roubar minha idéia. É muito triste isso.

Meu amigo tinha razão. O lugar era muito triste. Mas também era fascinante. Aquela gente toda, aquelas neuroses, tudo era muito familiar para mim.

Ficou tarde e fui obrigado a dormir no sanatório. Partiria bem cedo no dia seguinte. À noite, tive uma longa conversa com o enfermeiro, que me deu detalhes sobre as demências mais comuns dos jornalistas. Era impressionante como ele conhecia o nosso mundo! Contei a ele sobre a minha carreira, sobre minha vida e tudo mais, e ele me ouviu com paciência. Antes de ir para cama, o enfermeiro me desejou bons sonhos e despediu-se.

- Quem sabe o doutor ainda não volta pra cá no futuro para passar mais tempo com a gente?

terça-feira, 8 de setembro de 2009

O sanatório – parte 1


Quando soube que um velho amigo estava em um sanatório numa cidade do interior, em uma ala específica para jornalistas, decidi visitá-lo. Sim, havia uma ala específica para jornalistas. A viagem de trem, que subiu uma serra para chegar à clínica, foi lenta. O sanatório ficava nas montanhas, perdido no meio do nada. E era triste, como não poderia deixar de ser. Meu amigo dormia e tive a permissão para esperá-lo no pátio, onde outros jornalistas loucos estavam, tomando um resto de sol, caminhando, falando sozinho.

Notei um homem de barba e cabelos longos sentado no chão. Embora devesse receber cuidados, estava em um estado deplorável. Lembrava um mendigo. Pegava sujeira dos cabelos e colocava na boca. Me olhava de um jeito agressivo. Foi então que um outro maluco, com uma aparência até elegante, aproximou-se. Sorriu, sentou-se ao meu lado e puxou assunto. Logo de cara disse que não era louco, que não deveria estar ali.

- Fui um dos jornalistas mais premiados de minha geração, sabia? Ganhei prêmios Esso e outros mais. Pode perguntar a qualquer um aqui. Sou o mais respeitado dessa espelunca.

Meu amigo ainda dormia. Será que recebeu uma dose cavalar de sedativo? O premiado jornalista, que se apresentou como Ernesto, não parava de falar, de contar suas glórias, sua trajetória de sucesso. Um enfermeiro me chamou para entrar. Finalmente.

- Nossa, o Ernesto fala demais, brinquei com o enfermeiro. Me contou todos os seus prêmios, falou das cerimônias de entrega, dos discursos de agradecimento...

- O Ernesto nunca ganhou prêmio, doutor, respondeu o enfermeiro. Aqui, tem um monte de ex-jornalista que nunca ganhou nada, mas fala que ganhou. Eram obcecados por isso.

Ri, meio sem graça.

- O único que ganhou um Esso aqui foi aquele sentado no chão – e apontou para o louco com a aparência deplorável, o que parecia um mendigo. Foi um fotógrafo e tanto, mas a cocaína acabou com ele. Perdeu família, dinheiro, o juízo, e acabou aqui, abandonado.

Suspirei. E voltei o meu olhar novamente ao homem que comia sujeiras do cabelo.

- Vamos lá, doutor, prosseguiu o enfermeiro. Seu amigo já acordou.

Continua no próximo post...

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Ricardão, o mais temido pelos jornalistas


São vários os riscos a que um jornalista está exposto em seu árduo trabalho. E, de todos, o que mais assusta os nossos nobres colegas de profissão é o risco de levar um chifre enquanto se está em um interminável plantão. É o que mostrou o resultado da última enquete deste blog.

Com 38% dos votos, o Ricardão foi visto como a maior ameaça aos jornalistas, superando adversários temidos, como um terrorista árabe, um corintiano e um parlamentar picareta (desculpem-me pelo pleonasmo).

Eu sou testemunha do poder do Ricardão. Subestimei o sujeito e, quando menos esperava, lá estava ele com a minha mulher e meus chinelos novos. Porra, não podia ao menos ter pegado os chinelos velhos? Mas agora não adianta chorar. Atenção, meus caros! Eis uma informação útil a quem trabalha até tarde nas redações ou assessorias de imprensa. E informação é tudo hoje.

A próxima pesquisa, já no ar, quer saber qual a maior saia-justa que pode enfrentar um apresentador de telejornal. Um teleprompter que não funciona? Uma matéria que não entra? Um entrevistado chato que não pára de falar? Ou uma crise de riso durante o programa? Bons votos!

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

O barbeiro demoníaco da Rua Cruzeiro


Ao contrário de alguns jornalistas metrossexuais que conheço, assíduos freqüentadores de clínicas de estética, sou um cara conservador. Ainda não compreendi muito bem esse lance de vaidade masculina. Um amigo até fez um alerta: “Duda, hoje o cara passa um creme na cara; amanhã, começa a raspar a bunda; depois, já está trabalhando na editoria de Cultura de algum jornal”. Minha única frescura é ir, a cada dois meses, ao salão do João, antigo barbeiro do bairro.

No salão do João, na Rua Cruzeiro, espécie de “sebo” também, eu resgato a leitura de umas revistas Playboy bem antigas e fico sabendo de todas as fofocas da vizinhança. O barbeiro, mesmo sem diploma de jornalista, sempre dá seus furos. Por ele, descobri que a filha do dentista engravidou do mecânico da esquina. Que seu Vitório, o velhinho que aluga o apê para mim, é viciado em Viagra com Coca-Cola. João não poupa ninguém.

Barbeiro, assim como taxista e aposentado, também tem opinião para tudo. Analisa cenários, faz previsões. João é comentarista de política: “Duda, ouvi dizer que o Lula vai dar o golpe e tentar o terceiro mandato”. João é comentarista de Esportes: “Se o Dunga não convocar o Ronaldo para a Copa, a gente não passa das oitavas”. João é comentarista do mundo do entretenimento. “Tô dizendo que esse Michael Jackson não morreu. Deve estar escondido na mesma cabana do Belchior no Uruguai”.

Minha ex-mulher sempre pedia para eu mudar o corte de cabelo, para algo mais moderno, num “centro de estética bacana”, mas nunca abri mão do salão do João. Sentado em sua velha poltrona de couro, em frente a um espelho com rachaduras e uma pequena televisão pendurada no teto, tenho informação e diversão. Só lamentei o dia em que o desgraçado espalhou pelo bairro que minha ex havia me trocado por um office-boy saradão, com a metade de sua idade. Barbeiro filho-da-puta!

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Um assessor de imprensa, muitas contas


Sem emprego em redação, o jovem jornalista vira assessor de imprensa. É contratado por uma agência para "coordenar" o núcleo de Saúde e Bem-Estar. São apenas duas contas - uma sociedade médica na área de urologia e um spa modernex do interior de São Paulo. Está feliz.

Duas semanas depois, assume mais dois clientes, de outros segmentos – um escritório de advocacia e uma agência de turismo. Mas não era para coordenar o núcleo de Saúde? Já não está tão feliz. No fim do primeiro mês, passa a atender também a associação de moradores de uma favela da Brasilândia, na capital (trabalho voluntário da agência). Começa a ficar de saco cheio.

O ritmo é frenético. Escreve vários releases por dia, muitas vezes, sem ter nada interessante para contar. Reuniões chatérrimas com clientes, cobranças do chefe, jantares com jornalistas, entregas de jabá, campanhas de divulgação, eventos, e-mails pra cá, telefonemas pra lá, o maldito follow up. O seu mailing de contatos da imprensa mais parece uma lista de músicas de cantor de churrascaria: tem de tudo. Em dois meses de trabalho, o saco está prestes a explodir.

A vida seria melhor numa redação? Quem disse que assessor tem vida boa, com horário para entrar e sair e folga de fim de semana? Mas o grande problema é quando tanta informação, de variadas fontes, começa a perturbar a mente do jovem jornalista. Ele precisa saber de tudo, da avançada técnica russa de emagrecimento do spa ao novo pacote Índia Maravilhosa da agência de turismo. Está quase ficando louco.

- Por favor, você pode me confirmar quando será o simpósio Urologia e a Saúde do Homem Moderno?, pergunta um jornalista, ao telefone.

- Dia 17.

- Mas dia 17 é domingo. Tem certeza?

- Opa, desculpa, fiz confusão. Domingo é a final do concurso Garota da Laje na Brasilândia. O simpósio é no dia 27.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

A felicidade nas pequenas coisas


Quando eu era jovem, ainda não existia a profissão de participante de reality show. Eu também não tinha o menor jeito para ser jogador de futebol ou líder de banda de rock. Mas havia uma chance de ficar rico e famoso: ser jornalista. Virei um jornalista cheio de nobres ideais, ilusões e quebrei a cara várias vezes, como já relatei num dos primeiros posts, “As desilusões perdidas”. Tornei-me apenas um pobre anônimo. E corno.

Ontem, eu li um pouco mais sobre o Michael Jackson, um cara que conquistou dinheiro e fama. Mas tinha uma vida de merda. Sim, uma vida de merda, porque é assim que se define a existência de alguém que suplica todos os dias a um médico a aplicação de anestésicos fortíssimos. É muito triste ter de viver sedado para não sentir as dores do corpo e da mente. E eu aqui reclamando de ter me tornado apenas um pobre anônimo. E corno.

Comecei a perceber quanta coisa boa eu vivi na minha carreira de jornalista, mesmo sem ganhar dinheiro e fama. O tesão do jovem Duda ao ver sua primeira matéria assinada não tem preço. A primeira matéria assinada na capa do jornal então me garantiu orgasmos múltiplos. Era delicioso conquistar, após meses, uma entrevista com alguém que não queria falar com jornalistas, mas que acabava falando comigo só para eu parar de encher o saco.

Como eu ficava feliz ao ver um caderno especial feito com tanto carinho e por tanto tempo enfim impresso nas minhas mãos. Como eu ficava feliz ao ouvir a estagiária gostosa dizer que a minha matéria do domingo estava ótima, quando eu achava que estava apenas boa. Como eu ficava feliz ao ter um fim de semana de folga depois de duas semanas trabalhando sem descanso. Como eu ficava feliz ao ganhar um jabá, mesmo que fosse um vinho barato para celebrar o Natal.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Televisão verdade


Ao ver o global Profissão Repórter da semana passada, sobre a vida em presídios, me lembrei do Documento Especial, jornalístico que ganhou fama a partir de 1989 na TV Manchete. O programa abordava, com irreverência carioca e de forma bem crua, temas polêmicos, como violência, sexo, drogas, sexo, religião e... sexo. Tinha uma edição tosca, mas foi um caso de sucesso de jornalismo investigativo. A apresentação era de Roberto Maya (foto), conhecido também por suas atuações em clássicos do cinema erótico nacional.

Uns amigos mais abastados, que têm TV por assinatura em casa, me disseram que o Documento Especial é reapresentado, há algum tempo, no Canal Brasil. Vasculhei no YouTube e encontrei algumas pérolas, como o episódio “Os pobres vão à praia”, considerado pelo antigo diretor do programa, Nelson Hoineff, o mais significativo de todos. A reportagem mostra um grupo de pessoas do subúrbio carioca barbarizando nas praias da zona sul. São cenas de baixaria total. Hoje em dia na TV, algo semelhante só nas sessões do Senado.

Em outro episódio, “Profissão: prostituto”, o programa apresentou, pela primeira vez na televisão, a Noite dos Leopardos, show de strip-tease masculino na Galeria Alaska, reduto gay do Rio. Revelou também como jovens desempregados e sem rumo na vida (talvez algum jornalista estivesse por lá) decidem vender o corpo para conseguir uns trocados.

Chamado de “televisão verdade”, o Documento Especial era uma espécie de reality show da TV brasileira de 20 anos atrás. Com uma vantagem: sem Kleber Bambam e Diego Alemão. Um prato cheio para quem gosta de jornalismo e do lado B da vida.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Campanha Jornalista Esperança


Para doar um frila avulso, sem atraso no dia do pagamento, ligue 0500-2009-501.

Para doar um emprego na modalidade pessoa jurídica (sem aquela bobagem de direitos trabalhistas), ligue 0500-2009-502.

Para doar um super-mega-hiper emprego com carteira assinada, ligue 0500-2009-503.

A doação é depositada diretamente na conta do Duda Rangel.

Sua participação é muito importante!

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Confissões de um jornalista


Estava na igreja para se confessar. Junqueira era um repórter de Política, usava terno e gravata, o cabelo e a barba bem aparados e óculos, com ar de seriedade. Nem parecia jornalista. Era um homem de princípios, que tinha medo de queimar no inferno.

– Padre, fiz uma matéria que acabou com a reputação de um homem. Só porque ele é contrário ao partido apoiado pelo jornal em que trabalho. Não concordei, mas fui obrigado pelo meu chefe.

– Engolimos sapos para manter o emprego, meu filho. Você só cumpriu ordens e sente culpa por isso. Reze dez ave-marias.

– Padre, tem uma outra coisa. Numa recente viagem de trabalho, todos os meus colegas falsificaram umas notas fiscais para ter um reembolso melhor. Eu não podia furar com eles. Colocamos tudo na conta do táxi. Ganho um salário de fome, sem hora extra...

– A vida está dura, meu filho. Reze mais dez ave-marias.

– Obrigado, padre, me sinto mais aliviado agora.

– Vá com Deus, meu filho. Mas não se esqueça de pagar sua contribuição para a manutenção da igreja, que anda meio atrasada.

Com todas as contas acertadas, Junqueira seguiu para a redação, onde teria um dia de muito trabalho. Encontraria também a estagiária do caderno de Economia, uma daquelas jovens ambiciosas que adoram homens de terno e gravata. Casado, o repórter sentia-se culpado pela idéia de ceder às provocações da garota, que o estava deixando maluco. Será que queimaria mesmo no inferno? Bem que o padre alertou: a vida está dura.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

A arte jornalística de viajar de graça


Em meio ao perrengue cotidiano, o jornalista busca apegar-se às pequenas coisas boas da profissão. Uma delas é, sem dúvida, viajar de graça. Quem resiste a uma viagem feita a convite de uma empresa aérea, de uma rede de hotéis ou de um festival de cinema? O jornalista espera pela viagem com a ansiedade que uma criança pobre espera pela merenda na escola ou um preso espera pela visita íntima. É uma questão de saciar a fome.

Nos meus tempos de redação, o pessoal do caderno de Turismo distribuía, com freqüência, viagens para repórteres de outras editorias. Já que não existia um plano de carreira, viajar era, ao menos, uma forma de recompensar os jornalistas pela ralação do dia-a-dia. Rolava uma disputa pelos melhores roteiros. Viajar era bom; para um lugar legal, melhor ainda.

Lembro-me até hoje do meu primeiro convite de viagem. O responsável pelo caderno de Turismo me chamou para um café. O grande momento havia chegado. Era foca e, nessa condição, não dava para contar com um destino maravilhoso, mas, como sonhar nunca custou nada, me imaginei em uma praia paradisíaca do Nordeste, num hotel bacana.

- Duda, teu editor te indicou para uma viagem pelo jornal. Você vai passar um fim de semana na Baixada Santista, mais precisamente em São Vicente, e escrever uma matéria sobre a cidade. Garoto de sorte, hein?

Minha sorte foi ter chovido o fim de semana todo, o que me deixou preso no hotel. Viajar para São Vicente era resgatar as férias de minha infância classe média. Era lá que eu passava as noites me divertindo num carrinho de bate-bate e comendo quindim. A barraca do doce ficava em frente à “biquinha”, uma fonte de água que é a grande atração turística da cidade.

A minha primeira viagem a convite de alguém rendeu muita frustração e apenas uma notinha para o caderno de Turismo. Sobre o quê? Sobre a revitalização da “biquinha”.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

A inveja é uma merda


Os amigos, inseparáveis nos tempos do colégio, tomam rumos distintos quando chegam à faculdade. O mais descolado vai estudar jornalismo; o mais nerd, engenharia. O primeiro troca as aulas sobre a Escola de Frankfurt e outras teorias pela cervejada, o truco e o baseado. Vive rodeado de meninas. O segundo dedica noites de sábado a estudar fórmulas e cálculos. O primeiro não perde a oportunidade de sacanear o segundo.

– Que vida chata você tem, hein? Não tem mulher naquela sua faculdade? Só macho? Devia ter estudado jornalismo.

O tempo passa e os velhos amigos estão formados. Num reencontro da turma do colégio, o jovem jornalista lamenta que ganha um salário de merda. Rala, rala e ganha um salário de merda. O jovem engenheiro, trainee numa multinacional, revela que recebe um valor quatro vezes maior. E mais: passará um ano na Suécia, sede da empresa, fazendo um curso de especialização que lhe garantirá uma ascensão ainda mais rápida.

– E o melhor são as minhas colegas de curso, todas mulheres, engenheiras suecas, umas loiras bem gostosas. Ai, que vida chata!

O jovem jornalista busca então uma saída estratégica. Pela direita.

A recém-concluída pesquisa deste blog – O que mais faz sofrer um jovem jornalista em seu emprego? – apontou como vitoriosa a alternativa “Ver o amigo engenheiro ganhar um puta salário como trainne numa multinacional”, com 38% dos votos.

A próxima pesquisa quer saber qual o trabalho de maior risco a que pode estar exposto um jornalista. Quem assusta mais: um terrorista árabe, um deputado ou o Ricardão? Votem!

PS: Ainda em relação ao fato de o jornalista ganhar mal em início de carreira, apenas uma ressalva: com o tempo, as coisas mudam. E ele passará a ganhar muito mal.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Toddynho


A modelo e apresentadora da RedeTV! Daniela Albuquerque, que acumula a função de mulher do dono da emissora, descobriu sua vocação para o jornalismo de forma inusitada, como revelou, certa vez, à revista Veja. “Eu estava tomando Toddynho no café-da-manhã. Na embalagem, tinha um negócio que explicava as profissões na linguagem de uma criança. O da minha caixinha era sobre jornalismo. Li e falei: ‘Caramba. É isso que tenho de fazer’. Tem tudo a ver com ser modelo”.

Decisões conscientes como esta me fazem acreditar num futuro promissor para a imprensa brasileira.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Paixões proibidas


Quando eu tinha uns 15 anos, costumava passar os dias quentes de verão dentro de casa, ouvindo o meu LP dos Smiths. Meu pai, com medo de ver o filho se tornar um garoto muito introspectivo, talvez com alguma tendência suicida, resolveu dar um conselho.

- Filho, você precisa sair mais de casa. Por que não vai a um puteiro?

Aceitei o conselho. Achava que a visita ao local seria desastrosa, mas curti a experiência. A menina, só um pouco mais velha do que eu, tinha olhos e lábios lindos, era inteligente, gostava de conversar. Voltei para casa e fui falar com meu pai. Estava encantado pela moça, queria levá-la ao cinema no dia seguinte.

- Porra, meu filho, ficar apaixonado por puta não dá.

Não a levei ao cinema no dia seguinte. Nunca mais a vi.

Lembrei essa história muitos anos depois, quando fui tomar uma cerveja com um velho amigo da faculdade de jornalismo, que há tempos havia mudado de ramo e se tornado um pequeno empresário de sucesso. Contei a ele sobre meu desemprego, e ele quis me convencer a trabalhar como representante comercial (vendedor) de um purificador de água que a empresa dele fabrica. Um fixo todo mês, comissões, chance de ascensão.

Expliquei que, apesar de estar sem emprego, tenho me virado bem com meus frilas. Disse ainda que não consigo fazer outra coisa além de ser jornalista, que amo esta profissão.

- Porra, Duda, ser apaixonado pela profissão de jornalista não dá.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Eu quero ser correspondente em Roma


Na semana passada, estava assistindo ao Jornal Nacional quando entra uma matéria sobre um certo caos na Venezuela. As imagens, com o off do repórter, mostravam um grupo armado, supostamente pró-Chávez, invadindo uma emissora de televisão em Caracas. Jogaram gás lacrimogêneo, causaram a maior muvuca. Então, vem a passagem do repórter, o correspondente para a América Latina, se não me engano. O cara estava onde? Em Buenos Aires! Sim, a milhares de quilômetros de distância, no outro extremo do continente.

É claro que não dá para pagar a viagem de uma equipe para a Venezuela só para cobrir uma “invasãozinha boba”, mas, aqui entre nós, cobrir da Argentina é muito esquisito também.

Às vezes, eu acho que vida de correspondente internacional está muito fácil hoje em dia. O bicho pega na Faixa de Gaza ou no Paquistão e a cobertura é feita tranqüilamente de Londres ou de Nova York. Tudo na maior paz. E, naturalmente, com a ajuda da Reuters e da internet. O repórter faz aquela passagem básica em frente a algum cartão postal da cidade e já está livre para pegar um cineminha ou um teatro.

Mas a coisa mais bizarra do mundo dos correspondentes internacionais é, sem dúvida, a loira da Globo que fica em Roma, mais precisamente a “setorista do Papa”. Esse é o emprego que eu pedi a Deus. Ah, se o Cara fosse meu amigo e rolasse um Q.I.. Morar numa puta cidade legal e ter uma rotina mais do que light. Eu só me lembro de a loira ter ralado um pouquinho quando o último Papa morreu e o novo assumiu. Passadas a agitação e aquela história da fumaça, ela deve ter respirado aliviada. Tudo voltou ao normal, um bom restaurante, um bom vinho...

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Fantasmas


Antes de entrar para a grande imprensa, mais precisamente em hard news, sentia um frio na barriga só de pensar no tal calhau. Ficava imaginando o que aconteceria comigo se um dia eu não entregasse uma matéria a tempo para o fechamento e, em seu lugar, entrasse um anúncio publicitário. Seria chicoteado em plena redação pelo meu atraso, sob o olhar de sadismo de meus colegas? Demitido por justa causa? Teria meu mísero salário reduzido pela metade?

O fantasma do calhau foi para o início de minha carreira de jornalista o mesmo que o monstro embaixo da cama e a loira do banheiro foram para a minha infância. No caso da loira do banheiro, eu até torcia para ela aparecer de vez em quando, coisa que nunca aconteceu.

Descobri, com o tempo, que anúncio publicitário é até bom. Garante a sobrevivência das empresas de comunicação e, por tabela, a dos jornalistas. O problema para nós, escribas, é quando o espaço dos anúncios começa a invadir o do editorial. Quantas vezes cheguei à redação e vi minha matéria de 50 linhas ser reduzida a uma de 20. Como bem filosofou Beaverbrook, antigo barão da imprensa: “Jornalismo é tudo aquilo que consigo enfiar entre um anúncio e outro”.

Assim como na redação, o departamento comercial dos jornais deve ter o seu “calhau”. Imagino o chefe da área gritando para seus subordinados: “Quem não conseguir fechar sua cota de anúncios até as 14 horas vai se dar mal. Os editores terão de colocar alguma matéria no lugar”. Pobres vendedores de anúncios. Eles também padecem com seus fantasmas.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

A carteirada


Tempos atrás, numa bilheteria de cinema, encontro Pedro, antigo colega de redação. Está ansioso para assistir a Vicky Cristina Barcelona, de Woody Allen. Disseram a ele que, no filme, Scarlett Johansson e Penélope Cruz se beijam na boca. Pedro saca do bolso uma carteirinha de estudante para pagar meia-entrada.

- Voltou pra escola, Pedrão?

- A coisa tá feia, rapaz. Esta eu mesmo fiz. Se perguntam alguma coisa, invento que faço o curso de História da Arte Barroca na Casa do Saber.

Pedro admite que até pagaria o valor total da entrada pela cena lésbico-erótica entre as atrizes. Diz também que se excita ao ver a Penélope falando espanhol.

Mas não pode pagar.

- Tô desempregado, Duda. E neste mês cai o último cheque do meu tratamento dentário.

E ri o riso dos desgraçados.

Pedro me faz lembrar de meus tempos de repórter, quando usava o crachá do jornal ou a carteirinha da Fenaj para invadir eventos culturais, esportivos, festas de bacana. Jornalista adora uma carteirada. É o seu momento de glória, de sentir que está levando algum tipo de vantagem na vida.

- Duda, se quiser, faço uma pra você. Só me manda uma foto e cinco Reais para a plastificação. Preciso estrear o novo Photoshop que comprei na Santa Efigênia.

Me despeço de Pedro e entro na sala do cinema, para ver um outro filme. Sentado no escuro, lá no fundão, penso em sua proposta de uma carteira de estudante falsa e na Penélope beijando a Scarlett. Uma dúvida também me intriga: quem será que faz um curso de História da Arte Barroca?