quarta-feira, 31 de março de 2010

O amor nos tempos do pescoção


O foca já se preparava para ir embora naquela noite de sexta-feira. Tinha um encontro marcado. Mas foi surpreendido pela notícia de que teria de trabalhar até as duas da manhã no pescoção. Nem sabia o que era um pescoção. Havia sido tão difícil marcar aquele encontro e agora teria de desmarcar? Ou pediria que ela esperasse um pouco? Ligou e disse que, em vez de chegar às 11 horas, chegaria à meia-noite, meia-noite e meia, no máximo. Não queria desmarcar. Esperou tanto por tal momento. Ela compreendeu. Como era seu primeiro pescoção, tinha pouca coisa para escrever e conseguiu deixar a redação bem antes do que projetara seu chefe. Dirigiu em alta velocidade e chegou ao bar um pouco antes de uma hora da manhã. Para sua tristeza ela não estava mais lá. E não teve uma segunda chance. Ficou sabendo depois, por uma amiga da moça, que ela queria distância de jornalistas. São piores que médico! Desde então, ele passou a odiar os pescoções.

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Era madrugada de quinta-feira, dia do fechamento do seu suplemento semanal. A redação ficava praticamente vazia. Ao contrário de muitos de seus amigos, que odiavam o pescoção, ele adorava. Por quê? Porque era também o dia do fechamento do suplemento dela. Ele, que sempre foi um cara solitário, mandava a ela mensagens pelo computador. E ela respondia. Vez ou outra, marcavam de se encontrar no café do corredor, mas não era para espantar o sono. Era para ficarem mais próximos. Na madrugada de quinta-feira, tudo era calmo por lá. Podiam conversar tranqüilamente. Viviam essa rotina havia meses. O fechamento, as mensagens, o café, os sorrisos trocados. E, ao fim do trabalho, sempre se despediam com um beijo no rosto, como bons amigos, e cada um seguia para sua casa. Até que, num certo dia, ele fez a ela um convite: deixarem o prédio do jornal, que ficava no centro, e seguirem a pé juntos até um bar próximo. Ela aceitou. Passaram então a viver uma nova rotina, fora da redação, sempre após o fechamento. Depois do bar próximo vieram outros programas, bem mais interessantes. Os pescoções, que sempre foram agradáveis a ambos, começaram a ficar sufocantes, porque demoravam tanto a acabar. E eles tinham pressa de viver.

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Eram duas horas da manhã e o jornalista ligava com insistência para sua casa. Mas ninguém atendia. Resolveu ligar então para o celular de sua mulher. Ela respondeu. Ele queria saber onde ela estava. E ela disse que estava em casa. Por que não atendia o telefone então? Deveria estar quebrado, ela supôs. Ele tinha uma boa notícia. Conseguiu dar conta do trabalho com eficiência naquela madrugada e já estava deixando a redação. Mas você não disse que chegaria em casa apenas às quatro horas?, ela perguntou, assustada. Sim, mas ele foi eficiente naquele pescoção e poderia ver mais cedo sua querida mulher. Ela, gaguejando, disse que ficara feliz com a notícia e pediu para o marido vir com calma, porque era perigoso dirigir em alta velocidade na madrugada. Ninguém respeita os faróis. Pediu ainda que ele passasse no mercado 24 horas e comprasse alguma comida.

- Compro, sim, querida. Eu te amo!

- Eu também te amo, Duda.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Respeitável jornalista


Elisberto apresentava-se como empresário, homem das finanças e artista. Comandava um circo, que foi herdado do pai e que, décadas antes, já havia sido herdado do pai do pai. Era um pequeno grupo mambembe que viajava pelo interior do Brasil. Além de dono do circo, Elisberto era o bilheteiro e contabilizava os lucros ou os prejuízos dos espetáculos. Vendia também pipocas e refrigerantes e, como era versátil, ainda subia no picadeiro para apresentar as atrações e encarnar o palhaço Amendoim.

Apesar de tanto esforço, o movimento do público diminuía cada vez mais. Não era fácil manter vivo um grupo circense em tempos de forte concorrência, com reality shows e escândalos mil na política. Mas Elisberto não desistia. Um dia, após uma apresentação, foi abordado por um homem, que não se identificou. O homem pediu licença para dar um conselho que ajudaria a aumentar o público do circo: uma assessoria de imprensa para divulgar os espetáculos nos jornais e rádios das cidades que o circo visitasse.

- Mas eu não sei fazer isso, não posso fazer, respondeu Elisberto.

- É claro que você pode. Qualquer um pode. Isso não exige diploma! Você já faz tanto neste circo, seria apenas mais uma atividade. Apenas escreva textos e envie aos jornalistas. Seja você o seu próprio assessor de imprensa.

O homem deu instruções a Elisberto de como fazer a coisa. Sugeriu ainda que, em cada cidade que o circo estivesse, Elisberto convidasse os jornalistas locais, seus filhos e amiguinhos dos filhos para assistir aos espetáculos sem pagar, com direito a guloseimas. Isso convenceria os jornalistas a falar bem do circo.

- Jornalista se vende por um saquinho de pipoca, disse o homem.

- Será mesmo?

- Brincadeira. Mas por dois saquinhos de pipoca, sim, um de salgada e outro de doce, riu.

Elisberto aceitou o conselho e passou a produzir releases, sem saber que o nome daquele texto era release. Chamava de “importante comunicado à imprensa”. Falava das atrações, das datas e dos horários das apresentações. Cometia alguns erros graves de Português, mas estava perdoado, afinal os mesmos erros também são cometidos por tantos assessores profissionais. Elisberto tinha a mania de começar todos os seus comunicados com “respeitável jornalista” e jamais se esquecia de chamá-los para assistir a um espetáculo como convidados de honra, com “toda a mordomia”, o que incluía pipocas salgadas e doces.

A estratégia deu um excelente resultado, a divulgação ajudou a levar mais público ao circo. Elisberto tornou-se grato àquele homem que nunca mais viu e sequer soube o nome. Feliz, passou a se apresentar como empresário, homem das finanças, artista e assessor de imprensa.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Manual de etiqueta para jornalistas em coletivas de imprensa


1) Quando chegar atrasado a uma coletiva, não encha o saco dos colegas para saber o que já aconteceu de interessante. Você vai ficar com fama de mala. Da próxima vez, acerte melhor o relógio suíço que você comprou no camelô por cinco Reais.

2) Em coletivas pela manhã, mesmo que você esteja morrendo de fome, nunca ataque a mesa do brunch antes do final da entrevista. Se não resistir, seja sutil: maloque um croissant por baixo da mesa, segurando-o em um guardanapo.

3) Se for rolar almoço e você descobrir que o cardápio é filé mignon ao molho madeira, cuidado para não soltar um “Caralho, filé mignon ao molho madeira de novo?”. É uma indelicadeza. Saiba que esta pode ser a principal (ou até mesmo a única) refeição do seu dia.

4) Se cada jornalista tiver o direito de fazer apenas uma pergunta, não tente dar uma de malandro e emendar cinco questões em uma só. Até porque o entrevistado não vai se lembrar das abobrinhas que você falou no começo da pergunta.

5) Se não tiver porra nenhuma de relevante para perguntar, fique de boca fechada. Sente lá no fundão e faça cara de conteúdo.

6) Se a coletiva for longa e bater aquele puta sono, não durma. Tente se distrair de alguma forma, brincando de tetris no celular ou, no caso dos homens, olhando para a bunda das meninas que trabalham em TV.

7) Se a coletiva for com algum famosão, tipo estrela do cinema ou de uma banda de rock, controle-se para não parecer mais um fã do que um jornalista. Nem pense em pedir um autógrafo para depois rifá-lo entre os amigos de redação e descolar uma grana.

8) Lembre-se de que jornalistas gestantes, idosos, sem carteira assinada ou que ganham o piso de cinco horas NÃO têm preferência na hora de fazer a pergunta.

9) Quando acabar a coletiva, não embarque no empurra-empurra de repórteres que querem se aproximar do entrevistado para fazer uma pergunta exclusiva. É mais fácil você tomar uma microfonada na orelha do que conseguir um furo numa coletiva.

10) Se o entrevistado for grosseiro ao responder sua pergunta, não discuta com ele. Nem prometa pegá-lo na porrada na saída do evento ou publicar uma matéria caluniosa.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Diário de um jornalista desempregado em Sampa


Uma vantagem de morar em Sampa, apesar de todos os problemas da cidade, é poder ter um dia cheio de atividades esportivas, culturais e gastronômicas com um gasto baixíssimo. Ou seja, um jornalista desempregado até consegue sobreviver por aqui. Para mostrar que isso é verdade, o blog acompanhou uma intensa sexta-feira na vida de um jornalista em Sampa. Sem trabalho há alguns meses, o profissional, de meia-idade, topou o desafio, mas pediu para não ser identificado e será chamado apenas de Jota.

7h: Após tomar um café da manhã rápido em casa (um pedaço de pizza que sobrou da noite anterior), Jota decide investir em um programa que fará bem a seu corpo e a sua mente, ambos já meio condenados pelas mazelas da vida. Vai a pé até um parque próximo e participa de uma aula de tai chi chuan. Gosta do ambiente acolhedor formado por muitos velhinhos aposentados e entrega-se aos movimentos da prática oriental. Sente-se mais relaxado. O único momento de tensão ocorre quando Jota resolve acender um cigarro durante os exercícios, sendo duramente repreendido pelo mestre. Gasto: nenhum.

9h: Jota decide fazer um passeio a pé pelo centro de São Paulo. Sente-se bem por saber que, enquanto aquele povo todo se estressa em um dia de trabalho, ele pode curtir seu ócio criativo. Quase cai na tentação de entrar em uma daquelas lojinhas de crédito fácil. Chega a uma praça famosa e acompanha o show de um artista mambembe, que faz diversas imitações, de Serginho Mallandro ao presidente Lula. Acha aquilo tudo patético, mas solta algumas gargalhadas sinceras. Gasto: 10 centavos (depositados no chapéu do artista).

12h: Almoço em um restaurante bem simples do centro. Pede o PF do dia e uma latinha de Kaiser (jornalistas adoram Original ou Serramalte, mas Jota está desempregado). Enquanto come aquele bife duro, ele se lembra do filé mignon ao molho madeira que devorava nas coletivas de imprensa e, emocionado, derrama uma lágrima sobre o prato. Gasto: R$ 6,00 (o café saiu de graça após uma negociação com o garçom).

14h: Como não pode ver um dos filmes do momento nas grandes redes de cinema dos shoppings, onde até a pipoca é absurdamente cara, Jota decide ir a um cineclube de cadeiras desconfortáveis. Mas é o que pode pagar. Tem de se contentar com um ciclo de filmes sobre o novo cinema croata. Percebe que sequer conhecia o antigo cinema croata, mas tudo bem, a experiência será, com certeza, valiosa. Assiste a um filme sobre a saga de imigrantes albaneses em Zagreb e, apesar de ter dormido 30% do tempo, sai impressionado da sala. Comenta com um casal de lésbicas ao seu lado que adorou o vigor da nova geração de cineastas sérvios (ops, fez uma confusão). Gasto: R$ 1,00 (pagou meia com uma carteirinha de estudante falsa).

18h: Contagiado pelo filme de arte, decide fazer um outro programa cabeça. Jota vai a pé (uma hora e vinte minutos de caminhada) até um centro cultural mantido por um banco para acompanhar o debate “Jornalismo e Contemporaneidade, o papel das novas mídias”. Sabe que precisa ficar por dentro do que os jovens estão fazendo. Após duas horas e meia de debate, Jota deixa o auditório empolgado com as idéias expostas no evento, mesmo tendo dormido 80% do tempo. Gasto: nenhum.

21h: Jota vai até uma barraquinha de sandubas perto do centro cultural e pede o principal combo do pedaço: um cachorro-quente com vinagrete e um refri. Gasto: R$ 1,70.

22h: Antes de voltar para casa, decide acabar a noite em grande estilo e permite uma extravagância. Vai a um puteiro. Precisa sujar um pouco o seu dia, que começou muito politicamente correto com a aula de tai chi chuan. O puteiro tem como clientela básica os motoboys. Na entrada, há várias CGs estacionadas. Jota apresenta-se como jornalista, sente-se importante. Promete autógrafos do William Bonner para as meninas e, por causa disso, tem direito a um drink e duas camisinhas de graça. Gasto: R$ 20,00 (tentou pagar meia com a carteirinha de estudante falsa, mas sua tentativa fracassou).

O gasto total de Jota foi de R$ 28,80. Se não considerarmos a puta, módicos RS 8,80.


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segunda-feira, 22 de março de 2010

Feedback


Na poltrona do avião, numa ponte aérea, esmagado entre dois homens de terno e gravata, seguia minha viagem para uma pauta do jornal. O sujeito da direita, de cabelos grisalhos, bem barbeado e ar imponente, carregava um jornal nas mãos, o da empresa onde eu trabalhava. Tinha cara de alto executivo. “Homens de terno e gravata parecem ser mais importantes, mesmo que, no fundo, sejam uns bostas”, dizia meu avô. No meio deles, estava eu, de camiseta, calça jeans, tênis e cara de sono.

O homem da direita começou a folhear o jornal. Depois de alguns minutos, pegou o caderno para qual eu escrevia e passou a ler minha matéria, que estampava a capa daquela edição. Fiquei ansioso. Nunca tinha estado tão próximo de um leitor que não me conhecia. Iria gostar? Leria até o fim? Parecia atento, interessado. Mas logo desviou o olhar, para conferir o rebolar de uma comissária de bordo que desfilava pelo corredor. Se soubesse o quanto eu tinha ralado, não teria feito tal desfeita com meu texto.

Pensei em abordá-lo. E se eu falasse que o Duda Rangel do papel era eu? Acreditaria num cara tão mal vestido? Acharia engraçada a coincidência? Seria indiferente? Em TV, os rostos ficam famosos; em impresso, somos meras assinaturas.

– Esses vereadores fazem um monte de sacanagem e depois usam a imprensa para limpar a barra com a opinião pública, comentou o homem, girando levemente o corpo em minha direção.

– O senhor falou comigo?, perguntei.

– Foi só um desabafo. Não entendo essa imprensa que engole qualquer asneira de um entrevistado.

É certo que, às vezes, engolimos mesmo algumas idiotices, mas alguns executivos engravatados não têm a mínima idéia do que é o trabalho de um jornalista, as dificuldades da apuração, a obrigação de ouvir os dois lados da história. O homem, então, virou a página do jornal e me esqueceu. Meu consolo foi o sorriso da comissária, que voltava pelo corredor, com deliciosas Maxi Goiabinhas nas mãos.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Dez coisas que todo jornalista deveria fazer antes de morrer


1) Beber com os amigos da redação até as cinco da manhã de uma segunda-feira (para celebrar não sei o quê), mesmo tendo de estar de volta ao jornal em poucas horas.

2) Fazer uma entrevista extremamente perigosa com, por exemplo, um traficante ou um psicopata tipo Hannibal Lecter, sem “focinheira” e dentro de uma cela de prisão.

3) Sair à rua para fazer uma reportagem com uma pauta nas mãos e voltar à redação com uma matéria apurada de um assunto totalmente diferente.

4) Libertar-se dos plantões cruéis e passar o maior número de Natais em família, para descobrir o verdadeiro sentido do amor e do ódio por aquela parentada toda.

5) Fazer uma grande viagem internacional a trabalho, para conhecer as belezas de outra cultura e, naturalmente, para comer e beber bem pra caralho às custas do jornal.

6) Dormir na rua como mendigo, mergulhar num tanque com um tubarão, ser stripper por uma noite ou trabalhar como gari, para descrever com mais realismo as suas histórias.

7) Mandar à merda aquele editor filho-da-puta – que tinha o maior prazer de colocar na sua bunda – e dar início a uma emocionante carreira de jornalista free lancer.

8) Pedir ao editor de arte para ele fazer uma fotomontagem em que você aparece como o executivo do ano na capa da Forbes, para você mostrar aos netos como era importante.

9) Pagar todas as contas sem atraso, pelo menos em um único mês de sua vida.

10) Negociar com o seu chefe uns dias a mais de folga, para você poder ter um filho. Ou plantar uma árvore. Ou escrever um livro.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Que porra é essa?


Na manhã daquela sexta-feira, eu, ainda um jovem Duda, cheguei à redação tranqüilo. Não estava na pauta do dia, tinha apenas uns textos para escrever para o fim de semana. Daria para almoçar com calma, fazer algumas pesquisas e paquerar a menina do arquivo. Mas como eu sempre me dou mal neste blog, a história deste post não poderia ser diferente. O pauteiro, que me via de longe, apesar de minha discrição, aproximou-se rapidamente.

- Oi, Duda, que bom que você chegou. O Roberto, que não pôde vir hoje por causa de suas cólicas renais, tem uma entrevista marcada para as 11 horas com o embaixador brasileiro nos Estados Unidos, lá no prédio da Bolsa. Você vai ter de segurar essa.

- Mas olha a minha roupa. Não vim preparado para entrevistar um embaixador.

- Você está ótimo, Duda, e agora não dá para ficar preocupado com isso. A pauta é sobre aquela polêmica da propriedade intelectual, da quebra de patentes e tal.

- Eu preciso pesquisar algo no arquivo antes de ir.

- Duda, voa para a Bolsa porque a entrevista é daqui a meia hora!

Voei. Aliás, um vôo cheio de turbulência no carro de reportagem. Estava desesperado, inseguro. Comecei a ter dor de barriga, as mãos suavam. Não tinha qualquer idéia do que seria a polêmica da propriedade intelectual com os Estados Unidos. Que porra era aquela? Naquele tempo, não havia BlackBerry, internet móvel, Google ou Wikipedia para me socorrer. Éramos apenas eu e minha ignorância no carro. Ou melhor, ao meu lado também estava o seu Péricles, motorista do jornal, cantarolando uma música sertaneja que tocava na rádio.

- Ô, seu Péricles, o senhor sabe alguma coisa sobre esse caso de propriedade intelectual, da polêmica com os Estados Unidos?

- Olha, seu Duda, a única polêmica com propriedade que eu tô sabendo é a questão da regularização das casas lá onde eu moro.

E começou a contar que morava num terreno invadido havia anos, que era área de manancial, mas que a prefeitura estava querendo dar o título de propriedade aos moradores. A minha cabeça viajava, não ouvia mais nada da história do motorista. Pensei em fazer a mesma consulta ao rapaz que vendia Suflair no farol, mas logo percebi que esta tentativa seria pior do que a primeira. E não era só o meu desconhecimento sobre o assunto que me perturbava. O que eram aquelas roupas? Calça velha, tênis velhos, camisa amarrotada. Ainda tinha a barba cerrada. O embaixador, com certeza, me olharia com cara de nojo.

Enfim cheguei ao prédio da Bolsa, com um ligeiro atraso e uma dor de barriga ainda maior. Subi, me apresentei e, minutos depois, fui recebido pelo embaixador. Com cara de nojo, é claro. Só fiquei mais aliviado quando apelei para a sinceridade. Contei das pedras no rim do meu colega de trabalho, que eu havia sido pego de surpresa pela pauta e que desconhecia o assunto. O embaixador riu e o que era para ser uma entrevista transformou-se num monólogo, ou uma aula sobre a polêmica da propriedade intelectual com os Estados Unidos. Entendi tudo e perfeitamente, e tive material abundante para, naquela tarde, escrever uma incrível notinha de sete linhas.

segunda-feira, 15 de março de 2010

A redação mais vigiada do Brasil


Já imaginou um Big Brother Brasil só com jornalistas? Conheça a seguir alguns candidatos ao grande prêmio do reality show: o kit jornalista feliz (um plano de saúde top do sindicato, uma carteirinha vitalícia da Fenaj, um fim de semana com acompanhante numa colônia de férias e meia dúzia de elogios).

A gostosa: a jovem jornalista tem tudo para ser a menina do tempo, mas quer mais: quer ter seu próprio programa de televisão. Pode ser um daqueles com dicas de beleza ou de esportes radicais. Antes de entrar “na redação mais vigiada do Brasil”, onde passará grande parte do tempo de minissaia cruzando e descruzando as pernas e exibindo os novos peitos siliconados, trabalhava como repórter num programa de subcelebridades. Sonha provar para o País, assim como sete mais sete são quinze, que, além de gostosa, também tem conteúdo.

O enrustido: o experiente repórter de Cultura, especializado em teatro, abandonou a carreira sólida para arriscar-se na “grande aventura da vida”, como ele define o programa. Seus amigos não acreditaram quando ouviram ele dizer isso na vinheta de apresentação. Logo ele, um homem que só falava de Brecht, Shakespeare e Tchecov, e odiava os reality shows da vida. Sua participação promete ser polêmica por causa de sua sexualidade. Será que ele sairá do armário, ou melhor, do confessionário?

O tosco: quando foi escolhido para participar do programa, recebeu uma dura advertência: nada de usar aqueles bonés com propaganda de cachaça ou material de construção como fazia nos campos de futebol como repórter esportivo de rádio. Está liberado, por outro lado, para falar putaria à vontade. Promete beber todas nas festas da redação, bolinar a gostosa e sacanear o enrustido. Acredita que pode sensibilizar o Brasil ao revelar o valor de seu salário. Diz que, por ser o mais miserável, é quem mais merece ganhar o kit jornalista feliz.

O gente boa: é um jovem desprovido de beleza, mas com um coração do tamanho dos peitos novos da gostosa. Seu jeitão nerd não deixa de ter certo encanto. Sonha fazer matérias sobre direitos humanos e focar sua carreira na área de sustentabilidade. Só toma sucos naturais (sem açucar) e é vítima de piadinhas por causa disso. Quer acabar com o mito de que todo jornalista é cachaceiro e putanheiro e mostrar um outro lado. O enrustido, com certeza, vai gostar desse lance do outro lado.

A marginalizada: a assessora de imprensa imagina que vai sofrer muito preconceito, simplesmente por ser a única assessora de imprensa do programa. Os demais participantes, todos jornalistas "convencionais", vão vir com aquele papo chato de que ela traiu a profissão, de que assessor não é jornalista e coisa e tal. Ganhar o jogo será uma missão mais árdua do que vender uma matéria sobre aquele decorador fracassado que era seu cliente.

A caipira: participar do reality show representa a conquista do mundo para a jovem do interior catarinense. É a primeira vez que deixa a sua cidadezinha, onde atuava como repórter no jornal do prefeito. Faz o tipo “sou tímida, mas topo ficar pelada na Playboy se rolar um convite”. Acredita que a mistura de caipirice e sensualidade pode conquistar o Brasil. Não descarta viver um grande amor no programa, desde que seja um sentimento verdadeiro, ou uma linda amizade, ou pelo menos uma matéria escrita a quatro mãos.


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sexta-feira, 12 de março de 2010

Epitáfios


Como já escrito aqui, neste blog, jornalista não morre; jornalista alcança o seu próprio deadline. E, quando o dia deste indesejado (ou desejado) fechamento está para chegar, não há o que fazer. Ou melhor, há sim: deixar um último texto, o famoso epitáfio. A pesquisa, que acaba de entrar no ar, quer saber qual dos epitáfios de jornalista é o mais espirituoso. Do final miserável, mas feliz, a uma última viagem, feita a convite do Capeta. Qual o seu voto?

A enquete que chegou ao fim – O Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, defensor do canudo, quer filiar não-diplomados. Você é a favor? – teve como vencedora a alternativa “Não. Isso seria uma contradição do sindicato. Ele só quer encher a burra de dinheiro.”, com 48% dos votos. Em segundo lugar ficou a opção “Sei lá. Pra que serve o sindicato dos jornalistas mesmo?”, com 26%. A entidade está mesmo em descrédito. Quanta ingratidão dos jornalistas! Logo o sindicato, cuja luta por nossa categoria sempre foi tão nobre e eficaz quanto à luta de José Sarney pela liberdade de imprensa.

quarta-feira, 10 de março de 2010

S.O.S. Jornalista


A rotina do jornalista é dura, cheia de apertos. Tudo seria mais simples se pudéssemos nos agarrar a remédios que resolvessem, de forma mágica, os nossos dramas. Mas, com exceção da vida de BBB, que não faz porra nenhuma o dia inteiro, nada é fácil em nossa existência terrena. Qualquer ajuda milagrosa seria surreal.

Sim, jornalista, você pode mudar a sua vida!

Um escritor qualquer de livros de auto-ajuda poderia, tranqüilamente, criar palestras motivacionais com foco específico nos jornalistas: “Você está sem perspectiva de crescimento na carreira? Acha que vai ficar 20 anos fazendo a mesma coisa na redação? Não desanime. O sucesso depende só de você!”. Ou “Você ainda quer ser um famoso apresentador de TV e dar autógrafos na rua? Acredite no seu sonho!”. Os jornalistas também poderiam participar de atividades em grupo, aquele lance da troca de energia, mentalização coletiva.

– Isso mesmo, se abracem, sintam as vibrações positivas, pensem que vocês estão recebendo um prêmio Esso, uma promoção do editor. O desejo de vocês vai se transformar em realidade.

– Professor, posso mentalizar também meu discurso de agradecimento pelo prêmio Esso?

Sai, capeta!

Alguém com nobres ideais religiosos poderia fundar a Igreja Nacional do Jornalista Desgraçado e promover o encontro dos 308 repórteres desempregados, em vigília por um frila urgente para pagar as contas em atraso. Mas a cereja do bolo seriam as sessões de descarrego. A igreja atenderia o fiel dominado pelas forças do mal. Aquele cara que, em uma semana, tomou dois furos da concorrência, não foi escalado para a principal cobertura do caderno no ano, perdeu a folga do fim de semana e ainda descobriu que não teria mais o aumento de salário prometido. Tanta coisa ruim junta só pode ser encosto.

– Desaloja, satanás, sai do corpo deste nosso irmão!!!

– Pastor, o senhor poderia também desalojar o meu chefe de reportagem?

Ouvido amigo

Existem alguns casos bem graves, de desesperança total. São profissionais que chegaram ao fundo do poço e pensam em deixar a vida terrena, cortando os pulsos ou fazendo uma matéria sobre a derrota da Gaviões da Fiel no carnaval paulistano com a camisa do Palmeiras. A salvação poderia vir por meio de uma central de atendimento por telefone, espécie de CVV, com voluntários altamente capacitados para lidar com depressivos da imprensa.

– Por favor, eu preciso de ajuda, acho que nunca serei um jornalista. Me considero um bosta. Não sei escrever, não sei fazer uma entrevista, não consigo arranjar um emprego decente. Até meu diploma não vale mais nada.

– Calma, meu amigo, o jornalismo não é tudo na vida. O senhor já pensou em fazer gastronomia?

segunda-feira, 8 de março de 2010

Um (T)exto (P)ara as (M)ulheres


Ela tinha um filho de dois anos para sustentar, um monte de contas para pagar, um ex-marido que não depositava o dinheiro da pensão. E trabalhava como jornalista. Nos dias de TPM, que eram muitos, ela tinha a certeza de que o pior de toda essa história era ser jornalista, porque, se tivesse uma profissão e um salário decentes, os outros problemas simplesmente não existiriam. Nos dias sem TPM, que eram os outros poucos, sentia-se orgulhosa de ser jornalista, apesar do salário de merda. Amava o que fazia.

Ela sabia que o menino, quando crescesse, teria orgulho da mãe, jornalista dedicada e, principalmente, corajosa, que enfrentava tudo e todos. Era uma mulher que nunca teve medo de se arriscar, inclusive no dia em que transou com o pai do seu filho, bêbado e sem camisinha. Nos dias de TPM, batia um puta arrependimento de seus atos inconseqüentes. Por que eu fui me apaixonar por um safado daqueles? Nos dias sem TPM, não se arrependia de nada. Achava até que o filho, aquela coisa linda, era a cara do pai.

Nos últimos tempos, ela estava bem distante do filho. Trabalhava como uma maluca no jornal e ainda fazia vários frilas fora da redação. O moleque passava mais tempo na creche ou com babás. Nos dias de TPM, sentia-se culpada, detestava ser o tipo de mãe ausente. Chegava a pensar em abandonar o jornalismo nos picos de crise. Nos dias sem TPM, até levou o filho para a pauta. A babá faltou bem na ocasião em que deveria fazer uma matéria na Bolsa de Valores. Naquela tarde, seu filho foi a alegria do pregão.

sexta-feira, 5 de março de 2010

O nosso pasquim


Uma das experiências mais divertidas que tive na faculdade foi quando criei, ao lado de alguns amigos, um jornal sobre minha turma do curso de jornalismo. Nossa linha editorial era sacanear geral e ter a liberdade de criticar, com humor e ironia, o que a gente achava que não caminhava bem. Os deslizes dos professores, as aulas insuportáveis, os defeitos de nossos colegas e, acreditem, de nós mesmos. Minha inspiração vinha da leitura de O Planeta Diário e das antigas edições de O Pasquim. Não ganhávamos um puto por isso, mas éramos felizes.

Ganhamos, na verdade, a oportunidade de aprender, na prática e por conta própria, o que é fazer jornalismo. Com muita improvisação, cuidávamos de todo o processo de criação, da pauta até a distribuição do jornal aos leitores, nossos amigos de curso. A diagramação era precária, feita com colagens em papel sulfite. As impressões não tinham cores. Nossa redação era flutuante – a mesa do bar ou até mesmo o fundão da sala de aula. Eu gostava das reuniões de pauta, regadas a cerveja e gargalhadas, um grandioso brainstorm de merdas.

A gente escrevia o que dava vontade. Não tinha rabo preso com ninguém. Certa vez, fizemos, com foto-montagem, um provocante ensaio sensual da professora de Sociologia, uma italiana chata de mais de 60 anos. Em outra, num trabalho de jornalismo erótico-investigativo, revelamos as perversões secretas do diretor da faculdade. Os bastidores sórdidos das festinhas das repúblicas de alunos também eram pauta certa. Tudo escrito com muita irreverência e criatividade, é claro.

Conquistamos fãs, que esperavam ansiosamente a impressão da edição seguinte, sem prazo definido para sair. O compromisso com os leitores nunca foi nosso forte. A periodicidade do jornal era a “sai quando der”. Conquistamos também desafetos entre a turma e olhares atravessados de alguns professores. Tudo bem que, às vezes, nossas palavras eram assustadoramente ácidas, mas, no geral, o pessoal levava aquilo numa boa.

Por mais que a realidade de um jornal de faculdade, feito por amigos, seja bem diferente da encontrada no mercado de trabalho, esta experiência empreendedora é fascinante. Acho que todos os estudantes de jornalismo deveriam criar as suas publicações, aproveitando as facilidades das novas tecnologias e o incontrolável desejo de jogar bosta no ventilador. O humor e a ironia nunca saem de moda e são formas inteligentes de denunciar as cagadas do homem. Vale a pena tentar!

quarta-feira, 3 de março de 2010

Jamais trabalharam como jornalista


A presença de jornalistas sem diploma no mercado de trabalho deve ser cada vez maior a partir de agora. É a nova realidade. Por outro lado, existe um grupo de jornalistas – bem grande, por sinal –, que cursou a faculdade, pegou o canudo, mas jamais viveu a profissão na prática. A mudança de rumo deve-se às mais variadas razões e circunstâncias. A seguir, conheça breves histórias de quem estudou para ser, mas nunca foi um jornalista.

No segundo ano da faculdade de jornalismo – sua grande paixão –, Janaína convenceu-se de que faltava algo à sua futura carreira. Desejava uma formação humana mais completa. Foi quando decidiu fazer, simultaneamente, o curso de História. Passaram-se dois anos, graduou-se em jornalismo, mas a sensação de lacuna em sua carreira permanecia. Prestou, então, vestibular para Ciências Sociais. Acumulou três diplomas e seguia insatisfeita. Partiu para um mestrado e, depois, para um doutorado. Jamais trabalhou como jornalista. Não sabe sequer como é o ar que se respira em uma redação. Semana que vem parte para os Estados Unidos para uma temporada de pesquisa numa universidade. Sua mala já está pronta, com roupas, livros e os vazios de sempre.

O pai insistiu para que Regina prestasse o vestibular. É importante ter um curso superior, dizia. Poderia ser qualquer um. Será que é apenas para ter uma cela especial quando cometesse um crime?, pensava ela. Optou por jornalismo, profissão chique. Não suportava as aulas de Filosofia e as teorias de comunicação, mas cumpriu sua missão. Após quatro anos, já tinha o diploma nas mãos, para orgulho de seu pai. Na semana seguinte, também com o apoio do pai, abriu uma loja de lingeries em um shopping e hoje é a rainha das calcinhas e dos sutiãs do pedaço. Jamais trabalhou como jornalista. Não sabe sequer como é a neurose do fechamento em uma redação. O principal aprendizado da faculdade foi descobrir que a carta mais importante do truco atende pelo nome de “zap”.

Fernando sempre conciliou a faculdade de jornalismo com a atividade de professor de Inglês. Trabalhava em escolas, dava aulas em sua casa. Com o dinheiro do árduo trabalho, conseguia pagar a faculdade e financiar os deleites sexuais de sua juventude. Ao se formar, não conseguia arrumar um emprego como jornalista. Mas, tudo bem, ele tinha as aulas de Inglês, que sempre o ajudaram. O tempo foi passando, o volume de aulas aumentando e a motivação de ser jornalista diminuindo. Hoje, tem sua própria escola de idiomas. Jamais trabalhou como jornalista. Não sabe sequer o que é uma reunião de pauta na prática.

Célia sempre foi uma menina ansiosa e um pouco medrosa. Desde a adolescência, freqüentava consultórios de psicólogos. Mas a faculdade de jornalismo lhe fazia bem, foi seu melhor remédio. Adorava aquilo tudo e tinha a certeza de que sua carreira seria um sucesso. No último ano do curso, contudo, durante uma atividade prática em sala de aula, seu texto recebeu uma crítica pesada do professor. Entrou em pânico, ficou paralisada. Se não conseguia suportar um revés na faculdade, não teria condições de enfrentar a pressão do dia-a-dia da profissão, refletia. Jamais trabalhou como jornalista. Não sabe sequer o que são os momentos de descontração numa redação, as piadinhas, o riso coletivo. Hoje, trabalha como vendedora de calcinhas e sutiãs na loja de lingeries de uma antiga amiga da faculdade.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Medo de quê?


De cabeça baixa e com a silhueta curvada, estava estático na plataforma de bungee jump, como que hipnotizado por seus 40 metros de altura. Ariosvaldo – ou simplesmente Ari – era um jornalista de 70 anos que nunca admitiu se aposentar para ficar enterrado em casa. Sempre viveu a profissão intensamente. Detestava ficar preso na redação. Era um homem da rua, que não se contentava em relatar os fatos. Precisava viver os fatos. “As matérias ficam mais verdadeiras”, dizia.

Certa vez, quando jovem, virou garoto de programa para contar a dura vida dos michês. Em outra, morou embaixo de um viaduto por um mês, em companhia de mendigos, para escrever sobre a rotina violenta dos moradores de rua. Foram muitas aventuras. Para alguns colegas de profissão, Ari adorava chamar a atenção dos outros. Queria ser mais importante do que a notícia. Para outros, era simplesmente um louco apaixonado pelo jornalismo.

Com a aposentadoria, passou a viver de frilas. Seu trabalho atual era mostrar o interesse do pessoal da terceira idade pelos esportes radicais. “Ari, a pauta é a tua cara, coisa de maluco mesmo”, lhe afirmou o editor da revista. Estava animado com a empreitada. A empolgação, porém, contrastava com sua imobilidade fúnebre, instantes antes de saltar. O velhinho não se mexia. Seguia quieto, lá nas alturas. Ninguém entendia nada. Nem parentes, nem os curiosos que foram acompanhar o surpreendente espetáculo.

– É o que dá querer fazer o que não pode. Deveria estar em casa, escrevendo suas crônicas, de pijama – murmurou o fotógrafo da revista que o acompanhava na pauta.

O velho jornalista nunca dera atenção às fofocas. Não desejava provar nada a ninguém. Só queria trabalhar, sentir-se vivo, mas, naquela tarde, algo estava errado. Ari seguia imóvel, curvado. Parecia com medo. Logo ele, tão corajoso em suas aventuras jornalísticas! Teria se arrependido do desafio? Sentia-se mal?

Aflito, o fotógrafo decidiu que precisava tomar alguma iniciativa. Não agüentava mais ver aquela cena insólita. Correu até a plataforma e avançou com rapidez pela escada que levava ao topo. Como era alto lá de cima! Chamou pelo velhinho, que se virou para o rapaz. Estava pálido, coitado.

– Ari, o que aconteceu? Estão todos apreensivos lá embaixo.

– Não imaginei que esta hora pudesse chegar. Estou com muito medo.

– Medo de quê, Ari?

– De pular e perder uma das coisas mais preciosas que tenho.

– Sua linda vida?

– Não, meu amigo... a dentadura.