quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Eu, ranzinza


Tomando uma cerveja com um amigo, conversávamos sobre o meu blog. Quanto mais álcool entra em nosso sangue, mais sinceridade escapa de nossa boca. “Duda, você sempre foi um cara otimista, mas, lendo alguns de seus posts, notei que você está muito ranzinza, com a nossa profissão, com a vida. Cara, você ficou mais chato que taxista”, disse-me ele. Como ele estava pagando a cerveja, ouvi a crítica e não reclamei. No fundo, estava certo. Estou ficando um velho ranzinza. Mas será que um pouco de insatisfação é tão ruim assim?

A conversa de bar fez lembrar-me de um ensaio do escritor peruano Mario Vargas Llosa, publicado na edição de outubro da revista Piauí, uma defesa do romance, da literatura. Entre outras coisas, Llosa fala do poder que a insatisfação humana, muitas vezes despertada pelos livros, tem de transformar o mundo. Talvez eu nem faça literatura – muitos dizem que blog não é literatura –, mas, ainda assim, acredito que posso, com as minhas palavras, desenvolver nos leitores “uma sensibilidade inconformista em relação à vida”, como escreve Llosa.

A seguir, destaco um trecho do ensaio que achei interessante:

“Viver insatisfeito, em luta contra a existência, significa empenhar-se, como dom Quixote, bater-se contra os moinhos de vento, condenar-se, de certa forma, a viver as batalhas travadas pelo coronel Aureliano Buendía, em Cem Anos de Solidão, sabendo que as perderia todas. Isso é provavelmente verdadeiro; mas também é verdadeiro que, sem a revolta contra a mediocridade e a sordidez da vida, nós, seres humanos, ainda viveríamos em condições primitivas, a história teria acabado, não teria nascido o indivíduo, a ciência e a tecnologia não se teriam desenvolvido, os direitos humanos não teriam sido reconhecidos, a liberdade não existiria, porque tudo isso nasceu de atos de insubmissão contra uma vida percebida como insuficiente e intolerável.”

Estou decidido: em 2010, continuarei um cara ranzinza, insuportavelmente ranzinza.

7 comentários:

TetoSolo disse...

muito boa duda! Só tem uma coisa, o arthur, jornalista, personagem do último romance do marcelo rubens paiva, "da segunda vez que te conheci", virou cafetão e pelo que eu vi no começo da trama (que ainda não terminei) tá se dando muito bem.

Depois passo pra te falar como que ele termina a história. Se realmente der certo, topa abrir uma casa de tolerância? hehhehe

Abs!

Daniel

Anônimo disse...

Em mais uma postagem bacanézima, acho que vale ressaltar a importância de ser ranzinza, mas na dosagem certa. Senão, a insatisfação te tira a capacidade de ser feliz (apesar dos pesares) e isso mais à frente pode te causar um baita de um arrependimento. É só ver o exemplo das crianças: elas reclamam, choram, "dão birra", mas logo abrem um sorriso lindo e continuam sua árdua tarefa de ser feliz!

A impressão inicial que tive sobre sua pessoa foi muito próxima ao que seu amigo te disse. Mas, é inegável o talento que você tem, até quando é ranzinza!

Abraço, querido!

Jefferson Sato disse...

Muito bom! Estou contigo e não abro!

E com isso, cito o autor do texto: "Estou decidido: em 2010, continuarei um cara ranzinza, insuportavelmente ranzinza."

Amém!

Duda Rangel disse...

Daniel, já pensei em abrir uma casa de tolerância, assim como o personagem do Marcelo, mas temo repetir aquela história do "traficante viciado em cocaína". Aí, o negócio fracassa...hehehe
Brunna, sem dúvida, tudo na medida certa. E obrigado pela mensagem!
Jefferson, em 2010, nós, ranzinzas, vamos dominar o mundo. Valeu pelas palavras!
Beijos e abraços do Duda

Elisandra Amâncio disse...

Você é o jornalista ranzinza mais adorável que conheço.

Duda Rangel disse...

Obrigado pelo carinho, Elisandra. Abraços.

Bianca Leão disse...

Amei essa edição da revista Piauí. Viva a insatisfação construtiva!