quinta-feira, 12 de abril de 2012
O desafio de escrever 30 linhas quando você só tem informação para uma notinha de 10
A primeira estratégia é negociar.
– Ô, editor, não dá pra dar uma diminuída aí no espaço, não? Sei lá, deixar para umas 10 linhas. É o que eu tenho de informação.
– Não tem jeito. Hoje o noticiário tá fraco. Não tem ciclista atropelado, rico seqüestrado, anúncio de prédio novo. E temos que encher uma página inteira. Se vira.
– Ô, diagramador. Não tem como colocar uma foto e diminuir o texto, sei lá, para umas 10 linhas?
– Já tem duas fotos diagramadas, não viu, não?
Negociações encerradas, você pega de novo o bloquinho de anotações para tentar encontrar alguma informação que passou despercebida. Qualquer detalhe. Qualquer merdinha ajuda nesta hora. Mas nada. Lembra que entrevistou o sujeito no passado, sobre o mesmo tema, mas a notícia não chegou a ser publicada. Requentar o fato pode ser a solução. Abre a gaveta, busca os blocos velhos, investiga, acha as anotações. O quê? Não entende a própria letra. Com o tempo, os garranchos tornaram-se indecifráveis. Você pensa em ir até uma farmácia próxima. Farmacêutico decifra qualquer letra. Mas não há farmácia próxima. O fechamento, sim, se aproxima.
Você senta em frente ao computador. Respira fundo. Decide escrever as 30 linhas. Viaja ao passado, à adolescência, quando era conhecido pela imaginação fértil. Escrevia cartas de amor de três, quatro páginas. Tudo inventado. Porra nenhuma de amor. Mas agora é diferente. Jornalismo é coisa séria. Não é carta de amor da juventude. Ah, sim, há as artimanhas. O que seria de um jornalista sem as artimanhas? Em vez de “disse o promotor”, por que não “foi categórico em sua profunda análise o promotor Sebastião Pontes”? Punhetação jornalística!
E o texto sai. Sempre sai.
Depois de tanto esforço, reze apenas para o editor não surgir com aquele papo de que sua matéria foi, enfim, reduzida para as 10 linhas. Na última hora, sempre pode pintar um anúncio de prédio novo, lazer completo, terraço gourmet, o escambau. Coisa fina.
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12 comentários:
- Giovana disse...
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Estou bem nesse embalo por conta de uma reportagem de revista. Nem conto o tema para não passar recibo, as pessoas confundem as coisas..mas enfim, tô broxada!
- 12 de abril de 2012 às 10:46
- Ricardo Welbert disse...
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Duda Rangel consegue captar a essência do fazer jornalístico diário. A respeito do post, jornalista que é jornalista realmente precisa dominar estas técnicas de enchimento linguicístico para preencher os espaços exigidos pela editoria - mesmo sabendo que o assunto, caso o jornal fosse dele, não valeria sequer uma nota. Adorei a postagem, como sempre!
- 12 de abril de 2012 às 13:52
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Sempre assim: quanto menos informação você tem, mais espaço lhe é disponibilizado! É assim quase todo dia! Huahuahuauahua!
- 12 de abril de 2012 às 14:47
- Debora Claudio disse...
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e quando o contrário acontece? em televisão por exemplo, vc tem muita informação importante, mas o VT não pode passar de dois minutos
rsrsrs - 13 de abril de 2012 às 00:09
- Mila disse...
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Hauahauaaua,é bem assim mesmo né..
- 14 de abril de 2012 às 12:16
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"Abre a gaveta, busca os blocos velhos, investiga, acha as anotações. O quê? Não entende a própria letra. Com o tempo, os garranchos tornaram-se indecifráveis."
Isso sempre acontece! Hahahahahaha! Começo a achar que letra de jornalista é pior que letra de médico. - 14 de abril de 2012 às 22:06
- Luiza Carolina disse...
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O melhor é quando você enrola pra completar e depois as pessoas vêm dizer que a matéria está maravilhosa.
Apurar pra quê? - 16 de abril de 2012 às 11:16
- Duda Rangel disse...
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Pouca informação para muito espaço e muita informação para pouco espaço são situações comuns na vida do jornalista. Quem ainda não passou por isso um dia vai passar. Abraços.
- 16 de abril de 2012 às 18:31
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CARA#%* (que esse é um blog de respeito, kkk), mas isso sempre acontece comigo. E o pior é que no fim, sempre tenho que cortar a metade do texto, porque entro o anuncio do fulaninho e não há outra coisa a fazer do que cortar metade daquele texto filadap%$# que tu demorou duas horas pra fazer, após passar por uma crise existencial/profissional do tipo: pq fui escolher essa por#*? Mas sabe do que mais? Eu adoro... (;
Amei teu blog. Quem precisa de emprego ou de um bom salário, quando se tem o dom da palavra, né? (Não me xinga, hehehe). - 6 de junho de 2012 às 12:58
- Duda Rangel disse...
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Oi, Daiane. Fico feliz com tua mensagem, por saber que gosta dos meus textos. Está convidada a voltar mais vezes. Beijos.
- 7 de junho de 2012 às 15:52
- Katylenin França disse...
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Howw isso sempre acontece comigo
- 13 de setembro de 2012 às 23:03
- Duda Rangel disse...
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Katylenin, acho que isso acontece com muita gente. Beijos.
- 28 de setembro de 2012 às 17:56