Apalpou os bolsos e nada.
Foi só voltar à redação e se dar conta de que o bloquinho de anotações havia desaparecido.
Era especialista em fazer as coisas desaparecerem. Bloquinhos, canetas, celulares, ideias geniais de dez minutos atrás. Seu apelido na redação era o “Repórter Lost”.
- Porra, São Longuinho, me ajuda aí.
O santo, que não é bobo, fingia não ouvir. Ajudar jornalista dá muito trabalho.
No bloquinho perdido estavam todas as aspas bombásticas para a grande matéria do dia. Resolveu voltar ao local da pauta, a rodoviária da cidade.
- Por favor, o senhor não viu um bloquinho perdido por aí, não? Um bloquinho de anotações pequeno, assim desse tamanho, capa azul ou vermelha, agora eu não lembro, todo sujo, com umas folhas bem rabiscadas, tipo letra que só farmacêutico entende.
Repetiu a pergunta várias vezes e nada.
Por que não inventam um bloquinho com microchip, rastreado por satélite e o cacete?
Se não reencontrasse o bloquinho, teria de se lembrar das informações e das aspas bombásticas de cabeça. Logo ele que, por três vezes seguidas, havia sido reprovado num curso de memorização a distância.
- Porra, São Longuinho, eu dou mil pulinhos mais juros extorsivos de 13,7% pelo milagre, tipo cheque especial, topa?
O santo, que não é bobo, topou. Mas pediu 15%.
Foi o faxineiro quem encontrou o bloquinho. No banheiro.
- Ó aqui, seu jornalista, seu bloquinho perdido. Mas eu vou falar uma coisa pro senhor: essa letra aí nem farmacêutico entende.
A matéria estava salva, o faxineiro ganhou um beijo na testa e o santo levaria seus 1.150 pulinhos de boa. No carro, voltando à redação pela segunda vez, foi saboreando as aspas bombásticas. O deadline apertou. Pensou num lead.
Mas foi só sentar para escrever a matéria e... O que estava acontecendo? Queria porque queria digitar e nada. A ideia genial de lead de dez minutos atrás havia desaparecido. Assim, sem mais nem menos. E sem deixar rastros.
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terça-feira, 15 de abril de 2014
A arte de fazer tudo desaparecer
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