sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Bloquinho ou gravador?


Quando a gente fica velho, vez ou outra se pergunta como pôde ter sentido, na juventude, tanto medo idiota por coisas banais. Simplesmente porque, na ocasião, certas coisas não eram tão banais assim. Hoje, eu rio disso tudo. Talvez esta seja uma das vantagens de ficar velho: rir dos medos idiotas da juventude.

Era a tão esperada e temida véspera. Na manhã seguinte, eu, um pobre estudante de jornalismo, faria a minha primeira reportagem, para o modesto jornal da faculdade. As vésperas sempre me deixavam ansioso. Era assim desde os tempos de criança, quando eu assistia à missa do galo na tevê esperando o Natal chegar. Naquela noite, além de ansioso, eu estava tenso, com um medo danado de fazer merda. Minha mente viajava...

Não posso esquecer de pegar mais de uma caneta! Na hora H, a caneta sempre falha e a gente fica com cara de bobo. Então o entrevistado dá risada do foca atrapalhado. Isso não pode acontecer! E será que eu levo só um bloquinho de anotações ou um gravador também? Um jornalista experiente me disse, certa vez, que o bloquinho é melhor, porque faz a gente prestar mais atenção nas palavras do entrevistado, consegue captar a essência da matéria. É isso, vou levar só o bloquinho. E se eu não entender a minha letra no bloquinho? Minha caligrafia é péssima! Está decidido: vou levar o gravador. Mas peraí: será que não vou acabar dependente de uma máquina, de um gravador? Meu Deus, tenho de aprender a fazer uma letra mais decente. É, vou levar só o bloquinho. Mas, e se o entrevistado disser que eu escrevi várias mentiras, que ele não disse nada daquilo que está no texto e resolver me processar? Com o gravador, posso provar que ele disse tudo aquilo, sim! E agora?

Resolvi levar o bloquinho e o gravador. Só para garantir. A minha única (e grande) mancada foi esquecer de verificar se as pilhas estavam no gravador. Na hora H, o negócio não funcionou. O entrevistado caiu na gargalhada. Puta sacanagem com um foca atrapalhado. Então eu usei só o bloquinho. Minha letra ficou, naturalmente, horrível, mas aprendi que é bem melhor mesmo prestar atenção nas palavras, captar a tal essência.

10 comentários:

Anônimo disse...

Com o jornal-laboratório não passei tantos apuros. Mas certa vez fui fazer uma matéria pro estágio e tive a mesma dúvida: bloco ou gravador. Na dúvida e seguindo o conselho do Noblat, em 'a arte de faze rum jo0rnal diário', levei os dois. No fim da entrevista, percebi que o gravador permanecia desligado. Não fossem as poucas anotações do bloco, teria perdido uma baita matéria!

Ewerton Martins disse...

Hoje em dia, as entrevistas in loco cairam demais, né? É entrevista por e-mail, por telefone, por msn... ir até a fonte, sentar e começar a entrevista é raridade pelo que vejo...

O que leva a pensar que...

Tu tá velho, hein, Duda?

Flávia Romanelli disse...

Eu sempre preferi o bloquinho e já chegava na redação e ia escrever com tudo fresquinho na cabeça. Não tem coisa mais chata do que ficar ouvindo a entrevista novamente antes de escrever. Porém, recomendo gravar entrevistas de políticos e outros líderes para evitar aborrecimentos futuros do tipo: não foi bem isso que eu disse!

Christian Bernini disse...

Quero só ver quando for minha hora de ficar na indecisão de bloquinho/gravador. Começo o curso de jornalismo ano que vem :)


Parabéns pelos textos, vou aguardar o milésimo post!

Unknown disse...

Peço aos meus alunos que mantenham os dois instrumentos de trabalho em mãos. É bom gravar ao mesmo tempo que anota-se as palavras-chaves (e não tudo o que o entrevistado está dizendo, pois é melhor prestar atenção nas declarações pra poder argumentar, perguntar, questionar...). Depois da entrevista, o melhor é sentar e escrever tudo o que ouviu (como Capote) e, se tiver dúvidas, o gravador está lá, pra ajudar, pra pegar a frase que vai entre aspas etc...

Anônimo disse...

Ansiedade de principiante. Provavelmente a sua entrevistada ficou muito mais atenta às suas perguntas e a forma como eram feitas.
E hoje, ouvindo as fitinhas velhas, tbem dou risadas: "cara, as minhas perguntas eram sem lógica!".
Mas aí está um belo causo. Muito bom!

Duda Rangel disse...

Caros,
As entrevistas in loco, com bloquinho e gravador, estão virando coisas do passado. Hoje, como bem lembrou o Ewerton, a dúvida é entre o e-mail e o telefone. Tô ficando velho mesmo! Abraços.

Lanier Rosa disse...

Concordo plenamenteo com a Ayne Regina: os dois!
Anoto as palavras-chaves e recorro a gravação, para confirmar algo.

Ailime Kamaia disse...

Concordo totalmente com a Ayne, o bom é levar os dois. Anotar os pontos chaves no bloco e usar a gravação pra conferir os detalhes e colocar as citações.

Duda Rangel disse...

Lanier e Ailime, bloquinho e gravador podem, realmente, se complementar. É dão uma segurança a mais para o jornalista. Beijos.