quarta-feira, 31 de março de 2010

O amor nos tempos do pescoção


O foca já se preparava para ir embora naquela noite de sexta-feira. Tinha um encontro marcado. Mas foi surpreendido pela notícia de que teria de trabalhar até as duas da manhã no pescoção. Nem sabia o que era um pescoção. Havia sido tão difícil marcar aquele encontro e agora teria de desmarcar? Ou pediria que ela esperasse um pouco? Ligou e disse que, em vez de chegar às 11 horas, chegaria à meia-noite, meia-noite e meia, no máximo. Não queria desmarcar. Esperou tanto por tal momento. Ela compreendeu. Como era seu primeiro pescoção, tinha pouca coisa para escrever e conseguiu deixar a redação bem antes do que projetara seu chefe. Dirigiu em alta velocidade e chegou ao bar um pouco antes de uma hora da manhã. Para sua tristeza ela não estava mais lá. E não teve uma segunda chance. Ficou sabendo depois, por uma amiga da moça, que ela queria distância de jornalistas. São piores que médico! Desde então, ele passou a odiar os pescoções.

-----------------------------------------------------------------------------

Era madrugada de quinta-feira, dia do fechamento do seu suplemento semanal. A redação ficava praticamente vazia. Ao contrário de muitos de seus amigos, que odiavam o pescoção, ele adorava. Por quê? Porque era também o dia do fechamento do suplemento dela. Ele, que sempre foi um cara solitário, mandava a ela mensagens pelo computador. E ela respondia. Vez ou outra, marcavam de se encontrar no café do corredor, mas não era para espantar o sono. Era para ficarem mais próximos. Na madrugada de quinta-feira, tudo era calmo por lá. Podiam conversar tranqüilamente. Viviam essa rotina havia meses. O fechamento, as mensagens, o café, os sorrisos trocados. E, ao fim do trabalho, sempre se despediam com um beijo no rosto, como bons amigos, e cada um seguia para sua casa. Até que, num certo dia, ele fez a ela um convite: deixarem o prédio do jornal, que ficava no centro, e seguirem a pé juntos até um bar próximo. Ela aceitou. Passaram então a viver uma nova rotina, fora da redação, sempre após o fechamento. Depois do bar próximo vieram outros programas, bem mais interessantes. Os pescoções, que sempre foram agradáveis a ambos, começaram a ficar sufocantes, porque demoravam tanto a acabar. E eles tinham pressa de viver.

-----------------------------------------------------------------------------

Eram duas horas da manhã e o jornalista ligava com insistência para sua casa. Mas ninguém atendia. Resolveu ligar então para o celular de sua mulher. Ela respondeu. Ele queria saber onde ela estava. E ela disse que estava em casa. Por que não atendia o telefone então? Deveria estar quebrado, ela supôs. Ele tinha uma boa notícia. Conseguiu dar conta do trabalho com eficiência naquela madrugada e já estava deixando a redação. Mas você não disse que chegaria em casa apenas às quatro horas?, ela perguntou, assustada. Sim, mas ele foi eficiente naquele pescoção e poderia ver mais cedo sua querida mulher. Ela, gaguejando, disse que ficara feliz com a notícia e pediu para o marido vir com calma, porque era perigoso dirigir em alta velocidade na madrugada. Ninguém respeita os faróis. Pediu ainda que ele passasse no mercado 24 horas e comprasse alguma comida.

- Compro, sim, querida. Eu te amo!

- Eu também te amo, Duda.

20 comentários:

Renato Souza disse...

Como um bom estudante que sou, ainda nem fui Foca e muito menos conheço os tais "Pescoções". Mas prometo não marcar encontro algum depois dele. Prometo não me envolver com mulher alguma dentro da redação e prometo SEMPRE ligar para avisar que estou indo para casa.

Só não prometo parar de mentir.

Belo final, hein. rs

Talita Cruz disse...

Coitado do "foca", um dia ele vai ter a sorte do cara do segundo texto...só um jornalista entende um outro jornalista..rsrs

Poxa Duda, faz tempo que vc não lembrava da sua "cornitude"..e o cão Nestor, vc têm visitado?..:D

Bjss

Isa. disse...

putz Duda, foda hahaha

falando nisso.leiga ainda no assunto, o que são os pescoções?
beeijos
Isa
semtravasnalingua.blogspot.com

Duda Rangel disse...

Renato, com essa promessa de "não parar de mentir", já noto que você será um grande jornalista...hehehe

Talita, pois é, às vezes eu também me esqueço de minha cornitude. Quando lembro, procuro tomar um banho frio que a lembrança passa. Continuo vendo o Nestor a cada 15 dias e fazemos aqueles velhos programas de pais e filhos separados, como tomar sorvete no parque.

Isa, pescoção é um fechamento de edição que acaba muito tarde, geralmente na madrugada. Muitos jornais fecham suas edições de domingo na madrugada de sábado. Para entender melhor, releia este post http://desilusoesperdidas.blogspot.com/2009/01/pescoo-esse-incompreendido.html

Beijos e abraços do Duda

Cunha disse...

Muito obrigado pelo elogio e pelo apoio Duda, mas queria apenas ressaltar que inteligentes são os teus contos, meus comentários são apenas reflexo do bom trabalho feito por ti.

E fico muito feliz por divulgar o meu blog, mais uma vez, muito obrigado Duda, ainda mais sucesso pra ti!

Pedro Ivo Nunes disse...

Duda, muito bom seu blog. Cai aqui de para-quedas com um link do twitter e não consegui para de ler. Os textos me renderam boas risadas. Acho que visitei quase todos os posts. Sou estudante de Jornalismo ainda e formo este ano; seus textos são ótimos e tratam de uma maneira humorada as "desilusões" da nossa profissão (minha em breve, espero). Ganhou mais um visitante assíduo. Abraço.

Clarice Manhã disse...

olá! visitei o blog por recomendação de um amigo, da redação, e adorei! eu até q gosto dos meus pescoções, mas sei bem como é angustiante ter um encontro marcado nesses dias. E nos plantões?! Sempre aparece alguma pauta faltando 15 minutos para acabar, quando já estamos prontos pra sair!!!

Ariadne Lima disse...

Hahaha Adorei. Felizmente trabalho em assessoria e não tenho pescoções! rs Abraços, volto sempre.

Duda Rangel disse...

AC., muito sucesso pra ti também.

Pedro, valeu pelo carinho. Espero tuas próximas visitas.

Clarice, seja bem-vinda. A pauta surpresa no final de plantão é, realmente, um dos grandes castigos da redação.

Ariadne, hoje também estou livre dos pescoções, mas não trabalho em assessoria, estou desempregado mesmo...rs. Volte sempre ao blog.

Meus caros, abraços a todos.

Unknown disse...

Muito boa essa história. Aliás, tanto quanto a sua idéia de criar este blog, que mostra a nossa eletrizante rotina de forma tão real e engraçada.
Parabénsssssssssss, o mundo precisa mesmo de muuuuiiiitooo humor...
abs
Alexandra Alves

Isadora Marinho disse...

Estou amando seu blog, Duda!

Silvana Chaves disse...

É... Duda... é cruel!
Mas, tenho que dizer que adoro os seus textos.

Um beijo!

Silvana Chaves disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Mariana Serafini disse...

ótima tática a do mercado 24h!
hsushushsushsshsushsushus

Sabrina Franzol disse...

adoro ler o seu blog. A forma como você escreve é muito empolgante e divertida. Sou foca e adoro o meu trabalho. Embora haja muitos contras, os prós me satisfazem. rsrsrs. Até mais. Um abraço.

Alessandra do Vale disse...

Nossa amei este blog! Virei fã e vou fazer todos os meus amigos de faculdade se tornarem, pq na próxima aula de jornalismo falarei sobre ele, isto é fato.

Duda Rangel disse...

Sabrina, todas as profissões têm seus prós e contras. O jornalismo não é diferente. O legal é curtir o lado bom mesmo!
Leka, obrigado pela divulgação espontânea (e de graça) do blog.
Voltem sempre. Beijos.

Elisandra Amâncio disse...

Cheguei bem atrasada para comentar o post mas não posso deixar de dizer que chorei de tanto rir.

Amo tudo que você escreve Duda. Ou quase tudo (risos).

Sempre leio seu blog, mas é a primeira vez que comento. Cheguei aqui há tempos por indicação de uma outra amiga jornalista no Twitter.

Nós jornalistas, essa raça.
Abraço.

Duda Rangel disse...

Oi, Elisandra. Muito obrigado pelo comentário. Legal saber que você gosta dos posts. Volte sempre que puder! Beijão.

Meja disse...

Que graça, pergunta a estudande: "o que são os pescoções?"
Só se sabe sobre eles fazendo, filha! Sorte ai!