segunda-feira, 31 de maio de 2010

Como estragar um caso amor


Logo depois de formado, ainda sem emprego, me vi diante de uma escolha: aceitar o convite de uma garota interessante que me chamara para sair ou aceitar um frila? Compromissos de um mesmo sábado à noite. Difícil decisão para um libriano indeciso, excitado com a proposta da moça e com míseros trocados no bolso. A menina não era jornalista. Será que entenderia a minha situação? Pensei em alternativas.

Se eu inventasse uma desculpa qualquer para não sair, tipo encontro familiar de última hora, ela não aceitaria. “Festa de família? Você vai encher a cara com os amigos e depois pegar alguma vagabunda por aí”, diria. Se eu falasse a verdade para não sair, ela também não aceitaria. “Trabalho no sábado à noite? Você vai encher a cara com os amigos e depois pegar alguma vagabunda por aí”, diria. Então, decidi conciliar as duas coisas e a convenci a ir para a pauta comigo. Um puta programa de índio.

Minha missão era conhecer um novo reduto de bares gays em São Paulo. Ela ficou ao meu lado o tempo todo, silenciosa. Não reclamou de nada. Admirei sua compreensão e seu respeito à diversidade. Naquela noite, como retribuição, a levei a um restaurante bacaninha que ela tanto queria conhecer e paguei a conta sozinho, com a última folha de cheque do talão. Uma facada. Metade do frila que eu acabara de apurar (e nem tinha recebido ainda) ficou naquele pedaço de papel.

Dois sábados depois, também à noite, a arrastei para outro trabalho: um bailão da terceira idade. Não podia recusar frilas. A vida de jornalista apaixonado me dava muita despesa. Nesta pauta, ela até me ajudou. Escolheu personagens, fez fotos e auxiliou um senhor com uma doença crônica a tomar seu remédio enquanto eu o entrevistava. Admirei seu companheirismo. Naquela noite, como retribuição, tomei coragem e disse a ela um “eu te amo”.

No dia seguinte, ela me acompanhou a uma reunião de trekkers, aqueles fãs da série Jornada nas Estrelas que se fantasiam com roupas ridículas. Admirei sua paciência e seu nível de tolerância a nerds. Na noite daquele domingo, como retribuição, deixei de ver os gols da rodada para levá-la a um filme da Meg Ryan no cinema. Era o que eu podia lhe oferecer.

No outro sábado, mais um frila. Desta vez, porém, fui sozinho. Já não tinha namorada. Antes de dar uma bicuda em minha bunda, um dia antes, ela me disse que não suportava mais sair com jornalista, raça complicada. Admirei sua sinceridade. Naquela noite, ao menos, não precisei me esforçar para ser romântico.

4 comentários:

Renan Silva disse...

Tá aí uma das principais explicações para que jornalistas acabem se relacionando com colegas de trabalho. A verdade é que é muito difícil ter uma vida social e conviver com gente de fora desse meio. Mais um belo post.

A Viajante disse...

Desculpas masculinas são sempre alvos de críticas femininas...creio que isso tem relação direta com nossa cultura machista, que cristalizou a imagem de que homens mentem, que todos são iguais, e ponto. Mas eu não acredito em mais nada. Só acredito em papai noel, e no natal!

Duda Rangel disse...

Renan, também sou a favor da relação com colegas de trabalho (desde que esta relação não atrase o fechamento do dia).
Viajante, eu deixei de acreditar em papai noel faz tempo. Hoje só acredito em duendes, no coelhinho da páscoa e no aumento do emprego para jornalistas. Abraços.

Priscila Costa disse...

Muito bommmm Duda!