sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

O jornalismo investigativo 2.0


– Editoria de política, boa tarde.

– Por favor, eu gostaria de falar com o Tião Carvalho.

– É ele.

– Que honra!!! Tião, o maior repórter investigativo do Brasil.

– Quem fala?

– Gostaria de revelar um escândalo de corrupção.

– Amigo, ando sem tempo. Estou fazendo uma grande reportagem que exige horas de pesquisa no Google.

– É coisa quente, Tião. Esquema de mensalão. Sou ex-secretário do governador.

– Recebo denúncias a toda hora.

– Mas eu montei um dossiê completo sobre o caso.

– Dossiê? Já estamos falando a mesma língua.

– Tenho gravações de áudio e vídeo.

– É maracutaia nova? Esse negócio de dinheiro na cueca e na meia já não causa mais indignação.

– São cenas fortes, Tião. É o caso de um deputado conhecido por Papillon. O sujeito esconde dinheiro onde você nem imagina.

–Isso deve vender muito bem!

– E o material é exclusivo.

– A qualidade do som está boa? Não tenho saco de transcrever diálogos.

– Vem até com legenda, praticamente high definition, coisa de primeira. Tudo prontinho, do jeito que vocês, jornalistas, gostam.

– Maravilha. Preciso ver esse material.

– Eu até conheço um lugar bem discreto para a gente se encontrar, mas acho que você vai preferir que eu mande por e-mail, correto?

– Sim, mas, por favor, zipado, hein?

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Nenhum riso, ó, nenhuma alegria


Preparem-se, o ano de 2010 promete notícia chata! E não serão poucas! Houve praticamente um quádruplo empate na recém-encerrada enquete – Qual será a cobertura jornalística mais insuportável em 2010?. “A disputa eleitoral Dilma x Serra (ou Lula x FHC)” ficou em primeiro lugar, com 27% dos votos. A campanha ainda nem teve início oficial e, dias atrás, tucanos e petistas já trocaram insultos, mentirosa pra cá, jagunço pra lá. A imprensa, claro, registrou tudo. A baixaria começou cedo!

A equilibrada enquete, que mediu o nível de chatice do noticiário para este ano, ainda teve destaque para as demais alternativas: “A participação do Corinthians na Libertadores no ano de seu centenário” ficou com 25% dos votos, e “A overdose de matérias sobre o continente africano por causa da Copa do Mundo” e “Futilidades em geral (reality shows e as novas namoradas do Adriano, o Imperador)” empataram com 23%.

Nenhum riso, ó, nenhuma alegria, mais de mil jornalistas na redação! A próxima enquete, que já está no ar, está em ritmo de carnaval, ou melhor, em ritmo de jornalista trabalhando no carnaval. Quer roubada maior do que essa? O blog quer saber o que é pior para um jornalista que trabalha nesta época do ano. Ficar de plantão na redação enquanto as pessoas normais viajam ou se entregam aos prazeres da carne? Entrevistar uma semi-analfabeta musa de bateria? Pegar uma palavrinha do presidente da escola de samba campeã tão logo termine a apuração? Estas são apenas algumas opções. Não deixe de votar!

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Tudo poderia ser tão diferente


Sexta-feira, ou melhor, já é sábado, quase uma hora da manhã na redação. Estou duplamente feliz. Meu pescoção acabou mais cedo e terei um fim de semana de folga, após trabalhar 21 dias seguidos. O celular toca. É meu chefe. Difícil ouvir sua voz por conta do barulho do ambiente. O desgraçado deve estar numa festa. Então vem o golpe, cruel.

- Duda, eu sei que você tem trabalhado pra caralho, que está precisando descansar, mas vou ter de cassar sua folga novamente neste fim de semana. Tô precisando reforçar a equipe e você é o meu cara de confiança. Depois, a gente dá um jeito de você folgar.

Por que eu nunca consegui ser sincero e explosivo nessas horas? Tudo poderia ser tão diferente:

- O quê? Cassar a minha folga novamente? Bebeu? Pirou? Você sabe, meu caro chefinho, quantos dias eu não trepo decentemente com a minha mulher? Sabe? Quer que eu seja mais um corno no jornalismo brasileiro? É isso o que você quer? Porque, do jeito que anda a minha rotina, daqui a pouco minha mulher vai sair com o diretor de Novos Negócios da empresa dela. Esses diretores de Novos Negócios adoram novos negócios, principalmente os novos negócios dos otários que trabalham sem folgar, como eu, sabia? E o meu sobrinho e afilhado? Você sabe há quanto tempo eu prometi levar o moleque ao teatro para assistir à peça O cachorrinho vagabundo e seu amigo hamster? Não, você não sabe. Você não sabe como é difícil dizer ao seu afilhado pela enésima vez “Não, meu querido, de novo não poderemos ver O cachorrinho vagabundo e seu amigo hamster. Fica pra outro dia, tá bom?” E os reparos na minha casa? É você quem vai consertar a porra da privada que tá vazando e fica pingando na porra da cabeça do meu vizinho do andar de baixo? Resumindo, meu caro chefe: não vou ter merda nenhuma de folga cassada! Entendeu? Mer-da ne-nhu-ma! Se quiser, casse a folga de algum outro idiota desta redação!

Mas nunca consegui ser sincero e explosivo nessas horas:

- Amanhã? Reforçar a equipe? Claro, entendo. Depois a gente acerta essa coisa de folga!

E tudo foi sempre tão igual.


Releia também o post “Pescoção”, este incompreendido

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Clássico é clássico. E vice-versa


Se você é jornalista esportivo e um dia não puder, por falta de tempo ou de saco, entrevistar um jogador de futebol, não se preocupe. O blog preparou uma lista de frases feitas (e naturalmente idiotas) que sempre são ditas por jogadores. Use-as sem medo de errar! Em tempo: o título do post é uma homenagem ao ex-centroavante Jardel, grande pensador!

Quando o jogador perde um jogo
“O time inteiro se esforçou, todo mundo correu muito, mas, infelizmente, não deu para conseguir o resultado positivo hoje. O importante agora é levantar a cabeça, ver naonde (sic) a gente errou e seguir trabalhando duro nesta semana.”

Quando o jogador ganha um jogo
“O time inteiro se esforçou, todo mundo correu muito e, felizmente, conseguimos o resultado positivo, que são os três pontos. O grupo todo tá de parabéns! O importante agora é seguir trabalhando duro nesta semana.”

Quando o jogador é contratado por um novo clube
“A gente tá vindo para um grande clube naonde (sic) todo jogador sonha em jogar e a gente tá preparado para ajudar os companheiros a ganhar os títulos. A minha principal característica? Tenho muita raça e prometo dar o máximo de si (sic) e muitas alegrias para essa torcida maravilhosa.”

Quando o jogador se concentra para um clássico
“O time tá bem preparado, focado no jogo de domingo e vai buscar o resultado positivo, que são os três pontos. São dois grandes times, dois excelentes treinadores, respeitamos o adversário e é aquela velha história: em clássico, não tem favorito.”

Quando o jogador perde no início da temporada
“O time sentiu muito este início de temporada. A equipe tá sem ritmo de jogo, porque quase não jogamos ainda. E o preparo físico tá bem abaixo do ideal.”

Quando o jogador perde no fim da temporada
“O time sentiu muito este fim de temporada. O time tá num ritmo de jogo muito forte, cansado, jogamos muitas partidas este ano.”

Quando o jogador é expulso
“Eu não fiz absolutamente nada. Vocês viram. O adversário que colocou a cara no meu cotovelo. Mas eu conheço esse juiz, ele é mal-intencionado. E o pior é que a gente não pode xingar esse filho-da-puta, porque acaba sendo prejudicado no tribunal.”

Quando o jogador ganha um título
“Acho que esse título é para calar a boca de muita gente que não acreditava na nossa equipe. Falaram muita merda o ano inteiro, que o time tava desunido, sem vontade de jogar. Tá aí a nossa resposta. O grupo todo tá de parabéns, o professor, que sempre motivou a gente, também. Agora é seguir trabalhando, quer dizer, agora é descansar um pouco.”

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Impressões particulares


Jornalista não nasce. Jornalista é o “eleito”, aquele que chega ao mundo com uma nobre missão.

Jornalista não mente. Jornalista distorce um pouco a realidade.

Jornalista não revela um segredo por falta de ética. Jornalista apenas esquece que a revelação deveria ser mantida em off.

Jornalista não ganha presentes interesseiros. Jornalista só recebe um jabazinho inocente.

Jornalista não vai a boteco para tomar um porre. Jornalista discute temas essenciais à humanidade enquanto bebe pra cacete.

Jornalista não olha pra bunda das mulheres. Jornalista apura seu olhar investigativo.

Jornalista não ouve fofoca. Jornalista recebe informação de suas fontes.

Jornalista não se vende para operadora de turismo. Jornalista viaja “a convite”.

Jornalista não comete erros crassos por desconhecer o Português. Jornalista comete erros por estar sempre com pressa.

Jornalista não tem utopias. Jornalista tem apenas a simples pretensão de mudar o mundo.

Jornalista não faz bicos. Jornalista se dedica a trabalho free lance.

Jornalista não perde o rumo profissional. Jornalista se permite um período de reciclagem de idéias em Londres.

Jornalista não é desleixado com a aparência. Jornalista tem um visual descolado e provocador.

Jornalista não se acha o fodão. Jornalista tem certeza que é.

Jornalista não morre. Jornalista alcança seu próprio deadline.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

São tantas emoções


Tenho a lembrança de duas grandes mentiras ditas por um professor de ética na faculdade: “o jornalista tem a obrigação de ser absolutamente racional” e “vou colocar apenas a cabecinha” (no caso, para algumas inocentes alunas que embarcavam com ele em aventuras extracurriculares). Neste post, vou abordar apenas a primeira grande mentira. Será que o jornalista precisa ter a frieza de uma boneca inflável para contar uma história sem distorcer a realidade?

A questão me voltou à mente ao ver o Jornal Nacional da última sexta-feira, quando os apresentadores, imbuídos de um sensacionalismo dateniano, anunciaram por todo o telejornal uma matéria sobre o resgate de uma haitiana presa sob os escombros, três dias após o terremoto em Porto Príncipe. O que me chamou a atenção foi a postura da repórter, que mesmo visivelmente emocionada, no local da tragédia, conseguiu relatar o trabalho de resgate feito por militares brasileiros.

Carlos Alberto Di Franco, um crítico da imprensa brasileira, escreveu certa vez: “Jornalismo não é ciência exata e jornalistas não são autômatos. Além disso, não se faz bom jornalismo sem emoção. A frieza é anti-humana e, portanto, antijornalística.” Concordo com ele. Em certas coberturas é muito difícil ficar indiferente a situações de extrema penúria humana, como acompanhar flagelados de uma catástrofe natural, sobreviventes de uma guerra ou fãs ensandecidos em um show da banda Calypso.

Um professor dizer que um jornalista não tem o direito de se emocionar – que precisa fazer o tipo durão – é o mesmo que um pai dizer para o filho que homem não chora, que isso é coisa de menininha. Tudo bem que não precisamos nos tornar uma Helena do Manoel Carlos diante de uma cena de terror. Mas um pouco de coração mole não faz mal à isenção jornalística de ninguém.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Entrevista com o Doutor – parte final


Para quem ainda não leu a primeira parte, é só clicar aqui.

A Felizarda seguiu com o Doutor para uma sala da redação reservada a entrevistas, reuniões de pauta e eventuais barracos a portas fechadas. O problema é que a sala era toda de vidro e ficava fácil para as mulheres do lado de fora bisbilhotarem a dupla. Mal havia começado a entrevista e a Invejosa já havia tomado uns três cafés ali perto do vidro. O que mais irritou a Felizarda, contudo, foram as invasões da sala. A Recepcionista ("que vadia!") interrompeu a entrevista por duas vezes, a primeira para oferecer água e a segunda para oferecer chá ao Doutor. A Casada entrou outras duas vezes, a primeira para saber se estava tudo bem por lá e a segunda também para saber se estava tudo bem por lá.

Fora estes pequenos aborrecimentos, a entrevista transcorreu sem grandes problemas. A Felizarda ligou o gravador e o deixou bem pertinho do Doutor. Queria qualidade máxima naquela voz. A noite na banheira prometia. Como a Felizarda acumulou um vasto conhecimento sobre o tema (ah, quantas horas de pesquisa!), fez perguntas interessantes. A conversa teve fluidez e impressionou o Doutor, que elogiou o nível de informação da Felizarda. Ela fingiu um sorriso encabulado e convenceu-se de que a estratégia adotada (decote sem pudor + conhecimento) estava dando certo.

Era quase início da noite da sexta-feira quando a entrevista acabou. A Felizarda acreditava que a redação já estivesse vazia, mas ninguém havia arredado o pé de lá até o momento, principalmente a Invejosa, colada ao vidro e com seu oitavo ou novo copo de café nas mãos. O Doutor levantou-se, deixou seu cartão com a Felizarda e preparou a despedida.

- Ficou alguma dúvida?, perguntou ele.

- Nenhuma! Tudo compreendido!, respondeu a Felizarda.

- Que pena! Eu iria me colocar à sua disposição para solucionar qualquer dúvida. Se quisesse ligar depois para checar alguma informação...

- Bom, a gente sempre tem dúvida, né? Quem não tem dúvida? Posso não ter dúvida agora, mas com certeza vou ter dúvida depois, quando eu estiver ouvindo a fita na minha ban..., na minha bancada do escritório!

- Então, vou esperar você ter sua dúvida. Pode ligar mesmo no sábado, viu? Estarei em São Paulo neste fim de semana, sozinho.

A Felizarda acompanhou o Doutor até a saída da redação com um andar triunfante. Cruzou o ambiente sem medo, desprezando aquela mulherada que parecia fazer um corredor polonês. Tinha agora outra certeza: perguntas inteligentes numa entrevista podem não render uma promoção ou um aumento de salário; elas podem render muito mais!

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Poema ao jornalista (versão de Duda Rangel)


Salve, ó grande comunicador
Que o mundo um dia quis mudar
Desde cedo um explorado
Teve o diploma furtado
Seu salário é um reles trocado
Mas não deixa de sonhar.

Não folga em suas batalhas
Vence o pescoção sem esmorecer
Contra o Ricardão precisa lutar
Não tem tempo de dormir e almoçar
Pensa no lead no banheiro ao cagar
E não vê o filho crescer.

Um heróico sobrevivente
Bravo biscateiro, malandro jabazeiro
Com boca-livre de fome não morre
Das contas a pagar foge e corre
Sua paz encontra no porre
E com carteiradas no puteiro.

Ó, ilustre amante das palavras
Contestador, denunciante, anarquista
Defensor da liberdade de expressão
Curioso escravo da informação
Que mesmo na lama não perde o tesão
De ser um apaixonado jornalista.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Entrevista com o Doutor


Parecia que a redação pegaria fogo naquela tarde. Algo sensacional estava para acontecer e não era aumento de salário. A revista sobre medicina e saúde, que tinha uma equipe formada basicamente por mulheres, esperava pela chegada do Doutor, um homem respeitadíssimo em sua área de atuação, charmoso, elegante (médico de terno e gravata é tudo de bom, diziam elas), solteiro e, principalmente, heterossexual. Ele tinha uma entrevista com uma repórter, a Felizarda, para a matéria de capa da edição seguinte. O Doutor, consultor da revista, era simpático e fazia questão de ir à redação para a entrevista.

A Felizarda, também solteira, colocou a melhor roupa (de decote nada sutil), o melhor perfume e rascunhou as perguntas mais inteligentes sobre o tema da entrevista (ah, quantas horas de pesquisa!). A Casada, editora da revista, era também só luxo e despudor naquela tarde, afinal era outra apaixonada pelo Doutor, homem bem mais atraente do que aquilo que ela tinha em casa. A única pessoa que não estava feliz era a Invejosa, também repórter, que fez de tudo para ficar com a pauta, mas não conseguiu. Quando a Felizarda disse que o Doutor parecia o José Mayer, a Invejosa retrucou na hora, justificando que o José Mayer estava um velho decadente. A Felizarda explicou então que não se referia ao José Mayer de hoje, mas ao de uma novela antiga, quando ele fazia o papel do médico gostosão.

As mulheres daquela redação, quase todas solteiras ou separadas, estavam encalhadas e suspiravam pelo Doutor. Mereciam a sorte grande! Não entendiam por que a vida era tão ingrata com elas. Eram jornalistas maduras, inteligentes, descoladas, sem preconceitos na cama, evoluídas espiritualmente (todas faziam meditação) e preocupadas com uma alimentação natureba e com a beleza. O único homem por perto era o Estagiário que respondia aos e-mails dos leitores, bonitinho até, com certeza tinha um pau bem duro (o que é muito importante, é claro), mas usava o dia inteiro aquele maldito boné. Jornalistas maduras, inteligentes e descoladas não trepam com garotos de boné, acreditavam todas.

A Felizarda costumava fazer as entrevistas com um bloquinho de anotações (tinha uma mão ágil), mas para a entrevista com o Doutor ressuscitou o velho gravador. Imaginou-se decupando a fita naquela mesma noite, deitada na minúscula banheira de seu apê, com sais de banho franceses e velas ao redor. A voz do Doutor era sedutora, mesmo falando de “procedimentos” e outros jargões médicos. A fita acabaria e ela continuaria na banheira (com os sais, as velas e a sua mão ágil com dedos ainda mais ágeis), ouvindo a voz do Doutor e fantasiando que ele lhe proporia outros procedimentos, nada médicos.

Os delírios da Felizarda foram interrompidos pela entrada triunfal do Doutor na redação, conduzido pela Recepcionista, a jovem gostosinha que representava uma grande ameaça a todas aquelas jornalistas maduras, inteligentes e descoladas. A Recepcionista era, logo, uma vadia! A única pessoa que não se abalou com a chegada do Doutor foi o Estagiário que, com seu boné, não tirou os olhos da tela do computador. A Casada logo se levantou da cadeira para dar as boas-vindas ao Doutor. A Invejosa rangeu os dentes de raiva e a Felizarda abriu um sorriso, com uma única certeza: o Doutor estava mais do que nunca a cara do José Mayer, o da novela antiga, quando ele fazia o papel do médico gostosão.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Crise de abstinência


Folheava um jornal no começo deste ano e me lembrei de como é dura a vida de jornalista no período de entressafra da notícia, quando, afora as tragédias, quase nada acontece. Precisamos tirar leite, quer dizer, manchetes de pedra. A bola não rola nos campeonatos de futebol. Os políticos estão de recesso oficial (nos outros meses do ano, simplesmente deixam de trabalhar por sacanagem). A economia começa a despertar para o ano novo. E as gostosas do Big Brother ainda não desfilam de biquíni.

Por mais que os jornais fiquem fininhos, com poucas páginas, sempre há um buraco a ser preenchido, no bom sentido, é claro. Com diversos colunistas de férias, sobra ainda mais espaço para o “cozidão de ano novo”, matérias frias, assuntos desinteressantes que jamais mereceriam algumas linhas em tempos normais, balanços intermináveis e projeções furadas para o ano que se inicia. Nestas horas de crise de abstinência de notícia, o jornalista valoriza até o release do assessor de imprensa chato que o perturba o ano inteiro.

Se a correria do dia-a-dia é desgastante, a morosidade pela falta de informação é frustrante. Redação sem agito, sem suor escorrendo pela testa, sem gritaria na hora do fechamento é igual a festa sem música, sem bebida, sem uma rapidinha no banheiro. As horas se arrastam em câmera lenta. Não podemos nem reclamar que somos explorados pelo chefe. Que 2010 comece logo. Ou a imprensa morre de tédio.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Eu voltei!


Após passar uns dias em uma pousadinha vagabunda no litoral paulista – jornalista não tem dinheiro para um réveillon de bacana em Trancoso ou Floripa –, cá estou eu de volta ao blog, com uma puta saudade de escrever. Em 2010, vocês, meus queridos leitores, estão novamente convidados a rir de minhas desgraças. E, como a miséria jornalística já é bastante grande, aqui, neste blog, não precisaremos sacanear os garis.

Este post de retomada fala de pesquisas. A que acabou de ser encerrada – Como jornalista, qual o seu principal sonho para o Ano Novo? – teve uma vitória apertada da alternativa “Trabalhar menos e viver mais, inclusive transar mais”, com 32% dos votos. Se o Lula for esperto, ele aproveita o ano eleitoral e lança um projeto especial só para jornalistas, o “Minha Trepada, Minha Vida”. Poderia ser o maior programa de inclusão sexual voltado a formadores de opinião carentes da história deste País.

A pesquisa teve ainda um empate na segunda posição. Com 24% dos votos, ficaram as alternativas “Arranjar simplesmente um emprego. Vale qualquer coisa” e “Ver meu pobre diploma voltar a ter algum valor”.

A nova pesquisa – Qual será a cobertura jornalística mais insuportável em 2010? – já está no ar. As opções vão da avalanche de matérias sobre o continente africano – afinal, é ano de Copa do Mundo – à campanha eleitoral, passando, naturalmente, pelo centenário do Corinthians. Bons votos e um ótimo 2010 a todos.